domingo, 18 de fevereiro de 2018

Palácio dos Condes de Basto


Fazendo parte integrante da cidadela e do alcaçar mourisco, nos seus primórdios, foi cedido em 1176, pelo rei D. Afonso Henriques, à Ordem Militar de S. Bento de Calatrava, então cognomizada entre nós de Cavalaria de Évora e posteriormente ao ano de 1223, de Avis. Aos seus velhos muros, como residência real de D. Fernando, estão ligados alguns episódios notáveis da nossa História; encarceramento do Infante D. João, Mestre de Avis, salvo pela prudência do alcaide-mor Vasco Martins de Melo; amores adulterinos de D. Leonor Teles com o conde Andeiro e o assalto à fortaleza presidiada pelo alcaide Álvaro Mendes de Oliveira, em Janeiro de 1384, que tinha pendão levantado pela rainha D. Beatriz. Seguidamente, nele habitou, na qualidade de fronteiro-mor do Alentejo, o Condestável D. Nuno Álvares Pereira, que no local concentrou o reduzido exército de invasão de Castela, culminada com a Batalha dos Atoleiros (1385). 

A instalação dos futuros Condes de Basto no castelo é da época de D. Duarte e foi seu primeiro donatário D. Diogo de Castro, o Velho, fidalgo prestigioso que fez parte do séquito da Infanta D. Leonor, irmã de D. Afonso V matrimoniada em Sienna com o Imperador Frederico III, da Alemanha, no ano de 1451 e que figurou como capitão de ginetes nas campanhas do norte de África e na Batalha de Toro (1479), onde ficou gravemente ferido. Foram, sucessivamente proprietários do edifício D. Fernão de Castro o Magro, conselheiro de D. João II e 2.° capitão-mor da cidade por Alvará de 26 de Janeiro de 1485; D. Diogo de Castro que esteve encorporado no contingente da nobreza eborense na conquista de Tunis, em 1535, de auxílio ao Imperador Carlos V; D. Fernando de Castro, 1.° Conde de Basto por mercê de Filipe I, em 1572; D. Diogo de Castro, 2.° Conde de Basto, presidente do Dezembargo do Paço e Vice-Rei de Portugal, que sofreu os insultos da populaça durante as Alterações de 1637, e, finalmente, D. Lourenço Pires de Castro, 3.° e último Conde de Basto, morto na Catalunha ao serviço dos Reis Católicos em 1642. Nos seus magníficos salões viveram algum tempo D. João III (1533), D. Sebastião (1573-75), Filipe II e III (1582 e 1619), Vice-Rei Arquiduque Alberto (1593), Duquesa de Mântua (1634), D. João IV (1643), Príncipe D. Teodósio (1651) e o General Príncipe D. Juan de Áustria, filho de Filipe IV, no período de ocupação da cidade pelos exércitos espanhóis, durante a Guerra da Restauração (1663). A casa foi, ainda, habitada pelo arcebispo D. fr. Domingos de Gusmão, tio dos reis D. Afonso VI e D. Pedro II, que nela morreu (1678-89), pela Rainha de Inglaterra D. Catarina de Bragança (1699) e pela legítima sucessora do 3.° Conde de Basto e sua irmã, D. Joana de Castro, casada com Duarte de Albuquerque Coelho, senhor da capitania de Pernambuco, cuja filha e herdeira D. Maria de Castro e Albuquerque foi matrimoniada com o 7.° Conde de Vimioso. 

Ulteriormente, estes domínios foram integrados nos bens de D. José de Meneses e Castro, 13.° senhor da Patameira e da Caparica, pai do 1.° Marquês de Valada, titulares que os venderam no último quartel do século passado ao lavrador Vicente Rodrigues Ruivo, que neles habitou, assim como sua filha, D. Oliva Fernandes, até que os herdeiros desta, no ano de 1958 os alienaram em beneficio do eng. Vasco Eugênio Maria de Almeida, que nos paços promoveu, de acordo com a Direcção Geral dos Monumentos Nacionais, obras de restauro e reintegração arqueológica de altíssimo merecimento, as quais prosseguem em ritmo acelerado no tempo presente. O palácio, construído em planta sensivelmente rectangular e disposto em pavilhões de várias épocas, ocupa uma vasta área tanto coberta como de espaços livres e os chãos originais, doados pelo rei D. Duarte ao primeiro capitão-mor D. Diogo de Castro, que compreendiam o corpo oriental do alcaçar mourisco e residência-mãe da Ordem de Avis, incluindo a capelinha de S. Miguel, foram muito acrescentados no tempo de D. Fernando, futuro 1.° Conde de Basto, com a aquisição das casas do cónego Ambrósio Rodrigues e da rua pública que a delimitava. Datam deste período (c.ª de 1572), coincidindo com a permanência del-rei D. Sebastião nos paços, as grandes obras que o isolaram, definitivamente, das residências dos Marqueses de Ferreira, da comunidade de S. João Evangelista, a ocidente, e dos Condes de Portalegre e do Celeiro, do Cabido da Sé, a nascente-sul, culminadas com a construção dos dois portais externos, de granito almofadado, no tipo rústico, de arcos redondos e apilastrados. Nos frontões, triangulares, barrocos, conservam-se os armoriais marmóreos dos titulares: De ouro, com treze arruelas de azul, dispostas, em 3, 3, 3, 3 e 1, sem timbre. 

As frontarias do grande pátio, que olham ao nascente, sofreram transformações de monta e muito pouco subsistiu dos fundamentos do estilo gótico: dois portais lanceolados, de granito e uma fresta chanfrada. Todavia, da vultuosa empreitada concebida pelo capitão-mor D. Diogo de Castro em tempos do rei D. Manuel e parcialmente escondida no governo do seu sucessor na década de 1570, muito se descobriu no restauro actual, além do que já era visível e se não perdera através dos tempos. Belas janelas geminadas, de arcos de ferradura, de ajimez, fustes, capitéis e bases de fino mármore branco, alentejano; outros de arcos conopiais, de tijolo; uma portada de volta abatida e grupo de três meias canas nas jambas, de pedra, outrora encimada pelo escudo de família, de que existem vestígios, possivelmente da entrada principal. Alguns destes valores arqueológicos foram inexplicavelmente recobertos de argamassa e sumidos nos alçados. O corpo facial do edifício, para sul, é excrecência do tempo de D. Pedro II e foi mandado fazer pelo arcebispo D. Luís da Silva em 1699, para nele se alojar parte da comitiva da princesa D. Catarina de Bragança, rainha viúva de Inglaterra. Da 2a metade do séc. XVI e obra arquitectural de merecimento, é a galeria de dez tramos, encostada à torre protectora da PORTA DA TRAIÇÃO, sacrificada na mesma altura como obra militar, galeria suportada por dois anchos arcos de meio ponto, de granito, com gigantes de andares e ábacos emoldurados: tem abóbada com nervuras de aresta viva. Era o vestíbulo da casa da guarda do conde. O mais imponente pavilhão de todo o imóvel, é o das salas nobres do 1.° e 2.° andares, concebido em planta rectangular, angularmente cintado pôr grande aparelho granítico, com telhado de quatro águas, cuja fachada setentrional cai sobre a vetusta muralha da cerca velha, onde subsistem largos troços romanos e visigóticos de cantaria. 

Duas torres protegem estas empenas: a ulteriormente aproveitada para oratório palaciano e a da escada cocleada, aquela em forma cúbica e esta de secção cilíndrica. As janelas do primeiro pavimento são vulgares, de arcos abatidos e molduramento granítico, mas os três balcões superiores, geminados e de arcos conopiais de ferradura, de duas arquivoltas denticuladas de granito, capitéis, fustes e bases de mármore branco, são notáveis exemplares de arquitectura mudejar, onde as proporções, materiais e o desenho se combinam em rara harmonia de linhas. Decorando o beiral, em alto friso clássico, de ornatos naturalistas e geométricos, curioso esgrafito dos meados do séc. XVI, parcialmente reconstruído na década de 1950. INTERIOR Da vultuosa reforma de arquitectura da época sebástica, ordenada pelo futuro 1.° Conde de Basto, no piso térreo, são muito importantes alguns salões, principalmente os das Deusas da Mitologia, da história da Guerra Naval e o de Recepções, todos levantados com abóbadas de nervuras decoradas a fresco sob direcção do pintor Francisco de Campos, em 1578. O primeiro aposento é de planta elíptica, constituído por oito tramos de arcos abatidos, falsos, amparados por pilastras de perfis rectos e losângicos, actualmente escaiolados, mas sob os quais se vislumbram perdidas composições murais. O tecto, com doze ogivas de aresta viva, intervaladas por frisos de cordões, óvulos e pingentes polícromos, compõe-se de igual número de painéis em lisonja, sendo os quatro axiais iniciados por uma circunferência irregular de quatro diâmetros com raios engrinaldados de plantas e frutos silvestres, onde deliciosos amores brincam em variadíssimas posições, escalando árvores de frondosa verdura e colhendo pomos. Os quadros inferiores, na nascença das ogivas representam ninfas, sereias e deusas da mitologia clássica, com seus atributos e alegorias, paisagens e marinhas, onde dominam as velhas naus portuguesas quinhentistas. 

Estão todas as figuras vestidas ao gosto cortesão coetâneo, com as respectivas legendas latinas: Salmacis, Danae, Egina, Sione (Sinoe), Medea, Levcote (Leucotea), Grigone Pserqvina (Proserpina), em a qual, a seus pés, numa filactera retabular existe a data e assinatura do artista: F.O D.E. CÃ.P.V.S. 1578 Trabalho de intenção poética e literária, onde a voz da Fama se combina com as recordações da grandeza da sua época, está impregnado, estilisticamente, de um maneirismo mais neerlandês que italiano e que poucos exemplos deixou entre nós, podendo-se considerar, sem favor, dos mais preciosos murais da arte profana subsistentes em Portugal. Dimensões da sala: eixo maior, 8,05 x 6,70 m. A sala imediata, para ocidente, é outro curioso exemplar de arquitectura barroca disposto em cobertura nervurada, com 28 caixotões de aresta viva, completamente revestidos de frescos particularmente interessantes, onde se combinam, em exuberante exotismo os elementos ornamentais de fantasia, fito e antropomórficos e os temas de intenção histórica, seguramente comemorativos de um grande feito guerreiro dos anais da Cristandade - a conquista de Tunis e destruição das esquadras do pirata turco Barbaroxa, em Julho de 1535 - , onde se notabilizou o capitão-mor da cidade D. Diogo de Castro, senhor da casa, encorporado no exército de auxílio ao Imperador Carlos Quinto, dirigido pelo Infante D. Luís, filho do rei D. Manuel. Dois dos retábulos mostram episódios da concentração dos navios portugueses em Barcelona, sob direcção do almirante D. António de Saldanha e o ataque combinado das forças luso-castelhanas por mar e terra ao porto da Goleta. 

Nos restantes painéis dominam as crianças desnudas brincando com animais domésticos ou segurando cornucópias de abundância, mascarões, cariátides, guerreiros e ornatos naturalistas, metidos alguns, em tabelas e medalhões clássicos e barrocos. É obra pictórica do mesmo ciclo feita sob direcção do pintor Francisco de Campos. De mais antigas construções apareceram, nos alçados setentrional e leste da dependência, uma porta de arco lanceolado, gótico, dos fins do séc. XV e uma imponente colunata de dois amplos tramos arquitravados, que atinge as cornijas da sala, sendo os fustes ornados de capitéis de folhas de cardo e as bases de secção prismática, do estilo mudejar. Ligeiramente posterior é a elegante coluna axial, de fino alabastro, já da arte da Renascença, com capitel de palmetas torsas (c.ª de 1530). Dimensões da sala: comp. 8,50 x larg. 6,20. O salão de Recepções está intacto. De planta rectangular, com quatro tramos divididos por robustas colunas toscanas de granito e iluminado por três janelas de peito, de jambas chanfradas e vergas abatidas, tem cobertura de artezões completamente revestidos de pinturas a fresco, obra tanto de arquitectura como ornamental, dos primórdios da governação de D. Fernando de Castro (c.ª de 1570). Os caixotões losangulares, de grandes proporções conservam, com rara felicidade, o temático original, onde se entrelaçam, em profusão e larguesa de desenho, as composições zoomórficas, naturalistas e antropomórficas, além de outras, como trofeus bélicos próprios de uma residência de capitania militar, e míticos. O trabalho pictórico, onde se conjugam os estilos da Renascença e do Barroco, pertencem, também, à empreitada de Francisco de Campos, mas revela parceria e diversidade de técnica e inspiração. Dimensões: comp. 18,10xlarg. 7,50 m. 

Em comunicação directa com este salão, fica o secularizado oratório solarengo construído sobre o adarve de uma meia torre da antiga fortificação do castelo, nos meados do séc. XVI, e dedicado ao Cristo Rei, que no ano de 1591 estava muito bem decorado com cinco painéis de pintura a óleo sobre bordo, tinha altar de pedra e boas alfaias de prata e paramentaria. É de planta quadrangular e tecto hemisférico assente em trompas ornadas de tabelas geométricas. A porta de acesso, à escala humana, recentemente liberta, é de arco de ajimez, de tijolo, do estilo mudejar. No mesmo piso, para o lado meridional, ainda se conservam algumas dependências com vestígios de arquitectura apreciáveis: uma vasta sala dividida por arco gótico, de granito, de vultuoso lançamento (ulteriormente protegido por pilar de alvenaria), com abóbada nervurada, dos alvores do quinhentismo, e outra saleta imediata, com fresta ogival, chanfrada, e tecto de esteiras de secção losângica, de carvalho, levemente emoldurado. Este trabalho de marcenaria é da época renascentista e do último quartel do séc. XVI. Para ser reconstituída numa empena a determinar, existe em depósito no palácio, uma janela manuelino-mudejar, geminada e de arcos de ferradura de duas arquivoltas, com os respectivos toros anelados, laterais, de granito, fustes e capitéis esculpidos em mármore, que veio da fachada sul do destruído paço dos Morgados Pegas, em 1962, sito na Rua da República. No andar superior, as dependências do corpo gótico-manuelino-renascença, são as únicas, igualmente, de valor artístisco e arqueológico. O salão principal (que se atinge subindo cómoda escada helicoidal de torrinha cilíndrica e cobertura radiada), onde D. João IV e o príncipe herdeiro D. Teodósio se reuniram com o Conselho de Guerra para estudar planos de invasão de Espanha em 1643 e 1651, iluminado por três formosas janelas geminadas, dominando inesquecível panorama da várzea alentejana cortada no horizonte pela Serra de Ossa, tem proporções majestosas e é relíquia notabilíssima de arquitectura híbrida manuelino-mudejar datável de c.ª 1510. 

Disposta em planta levemente trapezoidal, tem as seguintes medidas: compr. 18,30 m, pela largura variável de 7,30 m até 7,50 m. Conservou, escondido sob outro posterior, até 1880, o tecto primitivo de castanho, obra inestimável de marcenaria árabe, colorida e de ornamentos geométricos, que o erudito Gabriel Pereira ainda viu em ruínas e, após apeamento, se cobriu de tecelagem servindo de céu do Teatro de S. Miguel. Do ladrilhamento pavimentar, antigo, subsistiu, apenas, no eixo da sala, um quadrado cerâmico de esmalte azul e amarelo. No alçado oriental, para o pátio, abrem-se mais dois balcões mainelados e de arcos de ferradura, estes de tijolo, em dimensões singulares, um deles transformado em porta de acesso ao varandim clássico erguido no tempo de 1.° Conde de Basto, que se apoia em dupla arcada redonda, de granito, com formosa colunata toscana arquitravada, de dez tramos de coluneis marmóreos, ornada de friso renascença de triglifos e métopas. As grades, de ferro batido, com balaústres de secção losangular, anelados e de ornatos insculpidos, são coetâneos, assim como o rodapé de azulejos enxadrezados, monocromos, de azul. Um dos pavilhões anexos, sobrepujante à sólida torre acastelada, reconstruída em 1648, também teve lambril cerâmico de idêntico fabrico, hoje desaparecido. A dependência contígua ao salão principal, manuelino, é antecedida por portal geminado e de arcos de ferradura, em ajimez, graníticos, coluneis marmóreos, lisos, capitéis e bases torsos. Em planta rectangular, com 8,25 x 6,80 m, de igual modo esteve recoberta por tecto de caixilharia árabe (perdida) e conserva as duas aberturas mudejares, ambas maineladas, uma para o exterior e outra de ligação à ante-sala do terraço dos jardins, parcialmente reconstituídas. Salvou-se, também, o alto friso da sanca, pintado a têmpera possivelmente por Francisco de Campos e seus colaboradores, em 1578, constituído por temas alegóricos e mitológicos de Diana a caçadora e de Andromeda ou outros de difícil interpretação: cenas de caça, combates singulares, infantis, animais e aves domésticos e ferozes, paisagens, símbolos do Amor e da Poesia, nereidas, Neptuno e Cepheu (?), rei da Etiópia e Perseu com o inseparável cavalo alado, Pégaso, salvando das garras do monstro a sua formosa Deusa. 

Angularmente, muito atingidos pela humidade, discos em grisaille com atributos da justiça (?). Dois painéis estão legendados em caracteres clássicos : DIANA E ANDROMEDA A galeria do jardim foi, também, edificada no estilo da Renascença pelo Conde D. Fernando de Castro, em tempos do rei D. Sebastião, absorvendo o recanto do pavilhão principal do edifício e ao nível do alçado do novo corpo habitacional, coetâneo. Por este motivo, as antigas janelas manuelino-mudejares passaram a servir de portais e subsistem embora refeitas nalguns pormenores, pois encontravam-se desde épocas indeterminadas escondidas nas paredes mestras. É constituído o terraço, por arcaria arquitravada, de dez tramos com coluneis toscanos de mármore branco de Estremoz, que repousam em quatro vãos de arcos redondos reforçados por botaréus de alvenaria e tecto nervurado, singelo. Na empena manuelina, ao nível térreo, vestígios de grande arco de volta inteira, frestas de molduras chanfradas e cunhal aparelhado, da mesma época. Nos desaparecidos jardins, de chãos terraplanados com o adarve da muralha medieval, vêem-se restos utilitários do período fidalgo: uma pequena fonte de repuxo, de mármore branco, barroca, traçada em pentágono irregular, dos primeiros anos do séc. XVII e a fonte e casa de fresco, construída em planta rectangular, de abertura redonda e do tipo de mergulho, possivelmente do mesmo tempo, porquanto conserva o forramento das paredes interiores, dos bancos e da taça quadrilobada, com azulejaria polícroma, do tipo de tapete, datável de c.ª 1650. Em época avançada do séc. XIX, a construção foi recoberta de elementos conchológicos, calcários e de cerâmica antiga, em caprichosa ornamentação, onde avultam as cruzes de Avis e de outras ordens militares portuguesas, albarradas, festões e no vão do arco, em embrechados, o armorial dos Condes de Basto. 

A actual entrada independente para os jardins, faz-se através de portado gótico, quatrocentista, de pedra, com chanfraduras e ábacos avançados, que foi deslocado da sua posição primitiva mas era do local e, no limite da propriedade, separando os quintais do extinto Convento dos Lóios, corre um pano de muralha do castelo velho, onde subsiste pequena casa de alvenaria, cujos alicerces são formados por blocos de cantaria trabalhada, seguramente restos da fortificação medieval. Numa reprega do mesmo muro existiu, também, no séc. XVI, uma porta que foi utilizada pelo rei D. João III e sua corte para assistência privada aos ofícios divinos celebrados na Igreja de S. João Evangelista. Igualmente quinhentista e do tempo do capitão-mor D. Diogo de Castro é o pavilhão das cavalariças e dependências da criadagem, erguido na face meridional do pátio, olhando ao ocidente. Foi bastante valorizado na década de 1940 para utilização como Albergue Distrital, mas o restauro, orientado pela Direcção dos Monumentos Nacionais não alterou, exteriormente, a traça original. Mantém as frontarias rijamente contrafortadas, os cunhais de granito, frestas e portal chanfrados, de verga abatida e a pitoresca escada setentrional, de arcos redondos, falsos, com varandim descoberto. As chaminés são do tipo tradicional do Alentejo, com caixas de ressalto. 

O grupo de casario da banda direita do observador, logo após o extradorso do antigo Celeiro do Cabido, confinante com quintais e outras dependências do velho paço dos Condes de Portalegre, foi integrado nos bens imobiliários da casa dos capitães-mores por D. Fernando de Castro, cerca de 1570, pouco depois da morte do seu proprietário, cónego da Sé Ambrósio Rodrigues. É constituído, essencialmente, por dois pavilhões de linhas rectangulares, mas assimétricas, o primeiro, a sul, dos fins do séc. XV ou começos do imediato, e o segundo, também de segundo andar, obra mais tardia e feita pela 2.° Conde de Basto D. Diogo de Castro, Presidente do Desembargo do Paço e Governador do Reino, com destino a aposento dos seus familiares e a hóspedes, nas vésperas da visita de Filipe II, em 1619. Aquele é um belo vestígio de arquitectura gótica e dos inícios da Renascença, com fachadas compostas por aberturas destes estilos, de molduras e jambas graníticas, de alvenaria e arcos redondos, lanceolados e abatidos. O pátio principal é antecedido por murete de porta arquitravada, sobrepujado por friso de merlões chanfrados, modernos. Curiosa e elegantíssima é a escada de acesso ao corpo superior, em caixa lateral suportada por pilar de base rectangular e patim cupuliforme, geminado, de agulha cónica, tecto de nervuras finas com chave redonda de ornatos exóticos e esbelto fuste marmóreo, de capitel mudejar. Na ilharga oriental e no piso principal, sobre terraço aberto com alpendre de dois tramos abatidos e de duplos arcos falsos, hoje, e antigamente abertos, de alvenaria, ergue-se o oratório do cónego donatário, construído no estilo clássico em planta rectangular e dimensões miniaturais: 2,07 x 1,27 m. A abóbada, polinervada, está enriquecida de chaves circulares, com ornatos naturalistas, estrelas e a central pela Cruz de Avis. 

Tem empena triangular composta nos acrotérios por esferas de alvenaria e portal apilastrado, de quartões rectos. Trabalho interessante da Renascença e dos últimos anos de D. João III, já se encontrava desafectado no ano de 1597. Os prospectos exteriores do casario, neste ponto, que deitam para pequeno quintalejo, têm muito carácter, pelo desencontro dos volumes de arquitectura popular, com chaminés de ressalto e cunhais de pedra aparelhada. Foi muito restaurado nos últimos lustros. No terreiro do Pátio de S. Miguel apareceram, nos nivelamentos pavimentares, algumas peças arqueológicas e um tambor cilíndrico, granítico, fragmento de coluna do Templo Romano. 

BIBL. Visitação dos oratórios de Évora em 1591, Cód. ms. n.° 61 da Livraria da Manisola (Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Évora), fls. 50-51; Gabriel Pereira, Estudos Diversos, compilados e publicados por João Rosa, 1934, págs. 143-46; Luís Reis Santos, Évora - Pinturas murais, in Diário de Notícias, 12-11-1933, em entrevista concedida a Celestino David; Túlio Espanca, Notas sobre pintores em Évora nos sécs. XVI-XVII, e Curiosidades de Évora, Cadernos de História e Arte Eborense, V e XXII, págs. 19-22, e 49-56, respectivamente. ADENDA O ramo familiar dos Castros de Évora - capitães-mores da cidade desde tempos do rei D. Duarte, futuros condes de Basto - descendia do fidalgo espanhol D. Álvaro Pires de Castro, Conde de Viana do Minho e de Arraiolos, alcaide de Lisboa e 1.° Condestável do Reino por D. Fernando I, irmão da celebrizada D. Inês de Castro. Os descendentes dos titulares - os marqueses de Valadas - fundaram e dotaram com rendas suficientes, na Rua do Hospital no Conde, 12, em Évora, um Asilo de Velhas Pobres de Santo António do Conde, que se extinguiu em data indeterminada no ocaso do século XIX. No edifício onde funcionou, constituído por altos e baixos, com balcões de ferro forjado, transformado em épocas recentes, realizava-se uma festa religiosa, pública, dedicada ao patrono - Santo António de Lisboa. 

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