Assim que entrou em funções o Governo Provisório da República assumiu como prioritária a tarefa de reformar o sistema monetário nacional, fazendo substituir o monárquico real (plural: reais ou réis) pelo escudo, de denominação mais adequada ao novo regime. A nova moeda entrou em vigor pela publicação de um decreto de 22 de Maio de 1911, e correspondia tanto em termos de valor como no de ouro fino à de 1.000 réis e apresentava-se em centavos, ou seja, dividida em cem partes iguais, colocando-se ao nível das dos outros países. Punha igualmente termo aos inconvenientes práticos da utilização do real, de valor muito pequeno e representado na escrita por um significativo número de algarismos.
Da emissão de notas e cunhagem de moedas se encarregou o Banco de Portugal, cujo 5º Governador foi Inocêncio Joaquim Camacho Rodrigues, natural de Moura e deputado eleito pelo círculo de Évora até 1915. Antes tinha sido nomeado Director Geral da Fazenda e Ministro das Finanças, sempre caucionado por José Relvas, que nutria por ele grande admiração intelectual. No cargo de Governador do Banco de Portugal se manteve até 1935, apesar da sua reputação e competência terem sofrido grande abalo quando foi ludibriado por Alves dos Reis, no célebre caso das notas falsas de 500$00.
Cabe aqui lembrar que o Banco de Portugal havia sido criado por decreto régio de 1846, com a dupla função de banco comercial e emissor, sendo resultado da fusão do Banco de Lisboa, fundado em 1821, com o objectivo de conceder créditos e aceitar depósitos, e da Companhia Confiança Nacional, lançada em 1844. Depois de vários contratos com o Governo, o Banco de Portugal tornou-se em 1887 a entidade bancária estatal, que passou a exercer em acumulação com a função de Caixa Geral do Tesouro e obrigando-se a criar agências em todas as capitais de distrito do Continente e Ilhas. Apesar de responsável pelo financiamento da dívida pública e de regulador do sistema financeiro do país, só em 1891 adregou a exclusividade na emissão da moeda.
Em Évora, o Banco de Portugal abriu a sua Agência no dia 24 de Setembro de 1892 no edifício da Praça de Giraldo em que ainda se mantém, e estava devoluto desde que a Câmara o deixara dez anos antes para se instalar na Praça de Sertório. O banco recuperou, com alguns cortes polémicos e sob uma traça afrancesada, os antigos Paços do Concelho de Évora, construídos no reinado de D. Afonso V e alvo de restaurações em 1481 e 1519 por ordem, respectivamente, de D. João II e D. Manuel I. Apesar de alguma controvérsia sobre a intervenção realizada, pode dizer-se ainda assim que o imóvel de algum valor patrimonial foi salvo da ruína que já o ameaçava.
Na cidade já existiam, no entanto, duas entidades bancárias: o Banco Eborense e o Banco do Alentejo, ambos fundados em 1875, ainda que o primeiro tenha funcionado no ano anterior com a designação de Caixa de Crédito Eborense. Segundo Helder Adegar da Fonseca, em “O Alentejo no século XIX – Economia e Atitudes Económicas” ,«em meados do século destacavam-se em Évora duas instituições como importantes fornecedoras de dinheiro a crédito: a velha Misericórdia local e a Casa Pia». A necessidade da criação de bancos era entendida, nomeadamente pelos grandes lavradores, como uma necessidade de extrema urgência visando o empréstimo de dinheiro a prazo.
É assim, grosso modo, que surge a citada Caixa de Crédito Eborense, com sede na Praça de Sertório, dotada do capital social de 33 contos de réis dividido em 660 acções (50 mil réis cada) e destinada a receber depósitos sem juro, à ordem, e com juro, a prazo fixo, fazer empréstimos a corporações do distrito e realizar descontos de letras. Os resultados obtidos levam os homens fortes da sociedade – o referido investigador identifica os quatro principais como sendo o visconde da Esperança, os lavradores José Maria Ramalho Perdigão e José Joaquim de Moura Amaral e o negociante Manuel Eduardo de Oliveira Soares – a proceder ao aumento de capital que se irá fixar nos 1000 contos.
Escassos dias antes, com sede em Évora na Praça de Giraldo e filial no Porto é anunciada a criação do Banco do Alentejo, iniciativa que envolveu por banda dos locais os negociantes João Lopes Marçal, Eduardo de Oliveira Soares, José António Soares Pinheiro, António Lopes Horta e António Simões Paquete; os proprietários e lavradores José Sebastião Torres Vaz Freire, José Carlos Gouveia, e Joaquim de Matos Peres; os médicos José Lopes Marçal e Joaquim Henriques da Fonseca e os professores liceais José da Fonseca e Costa e João Augusto Calça e Pina. Os nortenhos eram cinco com ligações ao Banco Comercial de Viana do Castelo.
O capital social inicial foi de 1.200 contos, divididos em 24.000 acções de 500 mil réis cada mas com possibilidade de alargamento aos 2.000. No âmbito da sua actividade tinha por objectivo «as operações de um banco de circulação, descontos e depósitos e todas as demais que forem próprias da sua natureza. Entre outras das mais destacadas teve a da emissão de notas. Foi um dos nove bancos nacionais que teve autorização para o fazer até à concessão da exclusividade ao Banco de Portugal.
Quando se implantou a República ambos gozavam de solidez e estabilidade. Helder Adegar da Fonseca, na obra já mencionada, considera que «a criação dos dois bancos teve importantes repercussões no mercado local de capitais. Por um lado, colocaram-se entre os principais fornecedores de crédito bancário na região, como o mostram o movimentos activos dos créditos hipotecários e em conta corrente realizado entre
1881 e 1910, sendo provável que o Banco Eborense tivesse uma posição muito forte no distrito de Évora. Em segundo lugar, com os depósitos a prazo, atraíram uma parte importante e crescente da poupança local».
Com alguma surpresa, o Banco Eborense entrou em fase de acelerado declínio, tendo encerrado em 1918. Não tinha conseguido suportar a garantia de segurança que o investimento em títulos governamentais viera trazer ao mercado de capitais. Em 1920 foi incorporado no Banco Nacional Ultramarino, entidade bancária criada em 16 de Maio de 1864 como entidade emissora de dinheiro para os territórios ultramarinos portugueses. Em contrapartida, em 1915 foi constituída na área dos seguros “A Pátria” – Companhia Alentejana de Seguros, velha aspiração dos lavradores que pretendiam proteger as suas searas sem que o crédito obtido deixasse de ser avalizado exclusivamente pelas suas terras.
Era deste modo que procediam as três principais seguradoras com agências locais, todas sediadas na Rua de Avis: “Portugal”, “Portuense”, “Portugal Previdente” e “La Union e Fénix Espanhola” A 24 de Agosto reúne pela primeira vez a comissão organizadora que coordenou os trabalhos de fundação e instalação da companhia. Fica definido que o capital social será de 500.000 escudos, divididos em 10.000 acções de 50 escudos, as quais ficam subscritas em três meses.
Com 200 acções, o máximo permitido legalmente, ficaram Inácio Fernandes Ramalho de Barahona, João Lopes Aleixo, Joaquim Simões, José António Fernandes Potes, José Rebolado Formozinho, José Joaquim de Oliveira e Júlio Rodolfo Fernandes Potes. José Gomes Severino arrebata 150, Alfredo Augusto Cunhal Júnior 110 e Luís Sangremann Proença 105. É este grupo de homens, entre os quais se notam alguns republicanos, que constituirão o núcleo duro de um total de 837 accionistas.
Estabelecendo a sua sede nos nº.s 24 e 25 da Praça de Giraldo, é no seguro agrícola que a “ Pátria “ concentra as suas preocupações, deixando bem vincado que é filha de lavradores. O resto é uma história de sucesso que ultrapassa o horizonte temporal desta edição.
Texto: José Frota
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