domingo, 10 de setembro de 2017

Convento de Nossa Senhora dos Remédios (Cemitério Público Municipal)


A fundação da casa monástica, na Ordem Reformada Carmelitana (os conhecidos padres descalços ou marianos), teve suas origens em 1594 sob auspícios do arcebispo D. Teotónio de Bragança no fundo da Rua do Raimundo, em casas e albergaria da Senhora dos Remédios, que posteriormente se transformaram na ermida de N.ª S.ª das Brotas. Dificuldades de ordem vária obrigaram a nascente comunidade a procurar novo sítio, o que se conseguiu pouco tempo depois por doações e compra de bom trato de terrenos em local sobranceiro às Portas de Alconchel. Iniciadas as obras conventuais com licença da Câmara de Évora, a transferência do núcleo freirático dirigido pelo prior fr. Tomás de S. Cirilo verificou-se no ano de 1606, tendo o antístite D. Alexandre de Bragança, acompanhado por membros do Cabido, deputações religiosas e delegados do poder civil assistido à cerimónia inaugural. Todavia, a sagração da igreja teve efeito, somente, em 1614, já sob beneplácito do novo prelado da diocese, D. José de Melo, que ao edifício outorgou a dignidade de padroado, segundo escritura pública lavrada no cartório do tabelião de notas Manuel Rodrigues, em 21 de Junho de 1625. Intervenção generosa nos acabamentos do templo coube ao fidalgo eborense Álvaro de Miranda Henriques, habitador vizinho do primitivo paço dos Mendanhas, que para o efeito concedeu, no ano de 1613, a importante esmola de duzentos mil reis. Ao edifício andam ligados eventos históricos de notória projecção nacional: a sua situação estratégica originou que nele se desenrolasse parte da luta travada pela posse da cidade, em Maio de 1663, entre os exércitos do príncipe D. João de Áustria e as forças do presídio comandadas pelo mestre de campo Manuel de Miranda Henriques. 

No dia 16 foi o convento tomado de assalto pela infantaria castelhana, que nele aprisionou a guarnição composta de 30 espingardeiros portugueses. Do campanário, estabeleceram os arcabuzeiros inimigos nutrido duelo de fuzilaria com as mangas instaladas na torre de Alconchel e no cubelo circular, sobranceiro à cerca monástica e o fogo foi tão intenso, de ambas as partes, que os portugueses acusaram a sensível perda de 25 mortos e 35 feridos. Contudo, o adversário teve de abandonar a posição dos terraços e de recorrer à artilharia do Conde de Almenara, estabelecida com parque na mesma cerca. No cenóbio transcorreu parte do escandaloso incidente da Beata de Évora, em Setembro de 1792 e vulgarizado no romance histórico de António Francisco Barata, o qual fora concebido e praticado pelo prior fr. Manuel de S. Carlos e pelo religioso fr. Félix de Jesus Maria, punidos depois severamente pela devassa do Santo Oficio ordenada pelo arcebispo D. fr. Joaquim Xavier Botelho de Lima. Ainda, no dia 29 de Julho de 1808, o convento sofreu tropelias cometidas pelas tropas da divisão francesa de Loison, com saque, destruições irreparáveis de obras de arte e fuzilamento de vários frades, pois a defesa da cidade estabelecera nele alguns francos atiradores que espingardearam o inimigo durante o ataque aos seus muros. Extinto pelo decreto liberal de Joaquim António de Aguiar, na cerca se instalou, a pedido da Câmara Municipal, o Cemitério Público dos Remédios, segundo letra de 30 de Maio de 1839, confirmada em 10 de Julho do ano imediato, com a benção dos terrenos oficialmente cedidos por D. Maria II. O aspecto geral do edifício, observado da Estrada de Circunvalação, de fachada axial olhando o norte, oferece silhueta de certo volume arquitectónico, embora pesada e do severo estilo barroco. 

Mantém a estrutura seiscentista, de cunhais e empenas fortemente cintados de pedra dispostos em andares, com frestas rectangulares e telhados de quatro águas. Num destes prospectos subsiste a caixa-mostrador de um antigo relógio de horas, coberto de fortes camadas de cal de obra. Altaneiro campanário de frontão circular, com dois olhais, é composto por igual número de sinos, de bronze, sendo o velho, ornado com legenda bilingue: ILLUSTRICIMUS D. ANTONIUS SANDE EBORENS. HUSUS COLLEG BENEFACTO SPECIALIS ET MA GNIFICUS HOC CIMBAL. CONFIA RE FECIT ANNO 1787. JOZE DOMINGOS DA COSTA O FEZ EM LISBOA O outro, moderno, foi fundido em Lisboa na oficina de Luís Belas, em 1891. Pequeno pátio de aberturas gradeadas, tendo no portado central uma tabela de volutas e pináculos com o armorial do padroeiro, D. José de Melo, antecede o terreiro da igreja, cuja fachada, de frontão triangular, muito acentuado, é terminado em discos de granito, nos acrotérios. A entrada faz-se por alpendre de três arcos de volta perfeita, com aduelas de pedra, sobrepujado por ampla edícula envidraçada onde se venera a Padroeira, imagem de mármore branco penteada de tons coloridos, de grande porte e dos inícios do séc. XVII. Lateralmente, em placas de mármore, ostentam-se os armoriais, barrocos, do arcebispo protector, também do 1.° terço do seiscentismo. As portas do templo e da portaria anexa, são de boas e robustas tábuas de matazana, do Brasil, recobertas de pregaria e pingentes de latão amarelo. A nave é de planta rectangular com quatro tramos, coberta por tecto de penetrações fechado no ano de 1614 (data esgrafitada, na abóbada, em curioso florão barroco, de massa, centrando as armas carmelitas, coroadas e metidas numa elipse perolada), e cruzeiro pouco profundo, que suporta uma cúpula cega, de meia laranja. A capela-mor está decorada por opulento altar de talhas douradas, de desenho e estilo rocócó, devido aos artistas eborenses Manuel e Sebastião Abreu do Ó e concluído no segundo terço do séc. XVIII. 

A obra preenche todo o espaço do santuário, com baldaquino, trono, colunata compósita revestida de grinaldas e sanefas e frontão entrecortado. "O conjunto monumental da talha dos Remédios, uma das mais primorosas obras de arte do séc. XVIII em Portugal de tendência linear, atingiu neste lugar o auge da riqueza. Estes três retábulos, que enchem a capela-mor e o espaço do cruzeiro, obedecem à fórmula chanfrada tão popular em Évora. Os colaterais, de uma sumptuosidade extrema ostentam a peculiaridade invulgaríssima de duplos frontões, de perfil ondulante, por baixo de uma imensa sanefa, de igual estilo. No principal, onde as colunas levam delicadíssimas rosas e folhas assimétricas, a planta complica-se, mediante as ilhargas côncavas, dando efeitos leves e delicados. Por cima do arco do nicho central, onde a imagem do Cristo está teatralmente exposta, desenvolve-se a maior passagem decorativa da Escola, onde as linhas da característica cartela são repetidas em diversas camadas contra um fundo cujos ornamentos parecem lavrados em ourivesaria. O caracter desta talha e em geral de toda a talha eborense dessa época é menos plástico que linear; o movimento é directo, dominado e controlado pelas elegantes sinuosidades das sanefas e dos remates" (Robert Smith, A Talha em Portugal). Em maquineta e pedestal do mesmo estilo, venera-se a imagem da Padroeira, de roca e vestia de seda branca bordada a ouro, sotoposta a severo e trágico Jesus Crucificado, de madeira incarnada. 

Dispostas em mísulas de dois andares enobrecem o conjunto as esculturas seiscentistas, em rico estofamento dourado, de S. Simão Stock e S. João da Cruz, no corpo inferior, e, no superior, de volume maior, as de S. José e Santa Teresa de Ávila, estas contemporâneas do retábulo. Medem, as primeiras, respectivamente, de altura, 0,76 d 0,84 m. Na parede do Evangelho, existe o túmulo do prelado padroeiro, construído em mármore azul e branco, regional, segundo modelo da arte barroca, com frontão armorejado e corpo de colunas toscanas, que conserva a inscrição da época, em português vernáculo: SEPVLTVRA + DE + DOM + JOSE PH + DE + MELLO + FILHO + DO MARQVES + DE + FERREIRA + DOM + FRANCISCO + PRIMEIR O + DESTE + NOME + BISPO QVE FOI + DE + MIRANDA + ARCEBIS PO + DE + EVORA + FUNDADOR + DO + PADROADO DESTE + CO NVENTO + COM + SEIS + MISSAS QVOTODIANAS + E + TRES + OF ICIOS + CADA + ANNO + POR + SVA ALMA + DE + SEVS + PAIS + IRMÃOS PADROEIROS + SVCESSORES E + PARENTES + FALECEO + A + 2 DE + FEVEREIRO + DO + ANNO DE + 1633 Na capela-mor conservam-se três tamboretes de madeira lavrada e ornamentada, com vieiras e pernas características do reinado de D. José (meados do séc. XVIII). As duas capelas do transepto, em colaterais, revestidas de talhas semelhantes e coetâneas do presbitério, são dedicadas a S. João Baptista e a N.ª S.ª do Carmo, figurando naquela uma interessante imagem policromada, do séc. XVII, e nesta uma figura de roca e vestia de tecelagem bordada, de somenos valor artístico, assim como o célebre crucifixo da beata Leonor Rodrigues, que assenta numa peanha-relicário de metal amarelo. 

Na parede fundeira, do lado do Evangelho, em mausoléu brasonado e esquiçado com simplicidade dentro das linhas barrocas, repousam as cinzas de D. Constantino de Bragança, instituidor do Morgadio do Maranhão, da esposa e da filha, trasladadas de Estremoz em 1639. Diz a inscrição: AQVI JAZEM DOM CONSTANTINO DE BRAGANÇA FILHO DO MAR QVES DE FERREIRA, E DE DONA EV GENIA FILHA DO DUQUE DE BRA GANÇA DOM GEMES: SVA MOLHER DONA BRITES DE CASTRO, FILHA DE DOM FERNANDO DE CASTRO E DE DONA IZABEL PEREIRA, E DO NA MARIA DE CASTRO SVA FILHA. ESTES OSSOS SE TRESLADARÃO DE ES TREMOZ PÊRA ESTA SEPVULTURA, E CAPELLA-MOR, A 26 DE JVNHO DE 1639 ANNOS. Muito original, como peça de túrgida explendência, é o púlpito de entalhamento dourado, feito segundo planos dos ensambladores irmãos Abreu do ó, oficiais do mister presumivelmente naturais de Évora: é do estilo rocócó e, seguramente, o mais notável do seu tempo no Alentejo. As formas da sua caixa, inspiradas nos púlpitos de Lisboa são, porém, executadas com uma delicadeza que "condiz perfeitamente com a assimetria refinada dos ornatos, o caprichoso perfil do espaldar coberto de palmas, donde se levanta a fantasia do dossel, que lembra uma coroa dourada da Virgem". 

Divide o corpo do cruzeiro, interessante teia de balaustrada de enrolamento torso, em madeira excêntrica sobrepujada por fogaréus estilizados. A nave conserva as duas capelas laterais, da invocação de Santa Ana e de Nossa Senhora da Conceição, abertas ambas em arcos de volta inteira, muito amplos e profundos e revestidos de bons retábulos de talha de fabricação eborense. A primeira, da Epístola, possui altar de colunata colorida, de certa nobreza de linhas, executado dentro do espírito dos trabalhos dos irmãos Abreu do Ó, onde subsistem, além do Orago, conservado em elegante baldaquinete revestido de folha de oiro (imagem ainda do séc. XVII), S. José e o Menino, S. Patrício, Santa Bárbara, todas de madeira estofada e polícroma, dos sécs. XVII-XVIII, e S. Joaquim e a Virgem, de barro cozido, curioso exemplar recoberto de roupagem iluminada, que mede de alto, 84 cm. O santuário sobranceiro, protegido por alta grade de cancelos de madeira dourada, com o Sagrado Coração no tímpano, possui mais discreto altar aberto e decorado com vários relicários do estilo rocócó, centrado pela medíocre tela pintada, setecentista, da Virgem da Conceição. Inferiormente, em sarcófago da cerimónia do enterro de Cristo, subsiste uma boa e trágica escultura de Jesus, de madeira incarnada, envolvido pela pintura da Lamentação do Túmulo, ao fundo, sobre tela, interessante. 

Na composição, dos alvores do setecentismo, figuram as quatro Marias do Calvário -Virgem Maria, Maria Madalena, Maria Salomé e Maria Cleopha, rodeadas de anjos lacrimejantes. Junto do arco abatido do sub-coro, encravada na parede da Epístola, existe uma lápide de mármore, comemorativa de donativo vultuoso para as obras do edifício religioso, que diz: ÁLVARO DE MIRÃDA ENRIQVES DEU DES MOLA PERA AIUDA DE SE FAZER ESTA IG REIJA DUZENTOS MIL RES NO ANNO DE 613 O coro alto encontra-se desadornado de quaisquer obras de merecimento, mas conserva uma boa e volumosa lâmpada de metal amarelo, de suspensão, do séc. XVIII. Na parede imediata fica o arruinado órgão, de lenho policromado, do setecentismo, encabeçado por revestimento de talha dourada, do estilo rocócó, que ocupa um tramo completo da igreja. Subsistem, no templo, as seguintes pinturas antigas: Capela-mor: A Caminho do Calvário, tela da 2.ª metade do séc. XVII; Cruzeiro: Nossa Senhora dos Remédios, tábua maneirista do 1° quartel do séc. XVII. Sobrepujante ao túmulo de D. Constantino de Bragança; Cruzeiro: Descida da Cruz, tela da 2.ª metade do séc. XVII, sobre a porta de acesso ao claustrim; Nave: Aparição da Virgem a S. João da Cruz e a S. Simão Stock, tábua da escola maneirista, do séc. XVII; Nave: Apoteose de Nossa Senhora do Carmo, grande e medíocre tela do séc. XVII, que pertenceu ao trono do primitivo altar-mor; Nave: Santa Ana e a Virgem, pequena tábua dos princípios do séc. XVII; Nave: Santa Ana e Anjos, tela seiscentista; Coro: Virgem e o Menino, tela, vulgar, e Sagrada Família, tábua fragmentada, do séc. XVII, em depósito. Muito curiosa é a Sacristia dos Remédios, enriquecida pelo notável paramenteiro de cinco corpos com quinze gavetões de pau santo brasileiro e do estilo português da época de D. José I, que preenche totalmente o fundo da sala. Mede, 8,15 m. de comprido por 1,10 m. de largura, ostentando nas ferragens recortadas, de metal amarelo, águias e corações. 

Ornamenta a peça, contra a parede, sobrepujante, um altar de entalhados dourados, com portas e nichos de relicários e oratório ao centro, com a imagem do Crucificado, de vulto, em pobre factura artística, dos fins de setecentos. De bom desenho, esmalte anilado e executados em oficinas lisboetas c.ª de 1700, são os silhares de azulejos do lambris, de dois padrões distintos, com sanefas floridas e motivos de figura avulsa, inspirados estes, em modelos de Delft, mas fortemente caracterizados pelas barras naturalistas tanto ao gosto da nossa cerâmica barroca. Contígua, fica a capela sepulcral de D. João Maldonado da Gama Lobo, revestida de estuques coloridos e marmoreados, onde existem, por aproveitamento de outro lugar, mas sem merecimento artístico, as antigas imagens de madeira de S. Domingos e S. Pedro de Alcântara. A lápide, marmórea, diz o seguinte: ESTA CAPELLA HE PERP.O JAZIGO DE D.JOÃO MALDONADO DE AZEVEDO DA GAMA LOBO, E DE SEUS DESCE D.ES FOI REFORMADA A SUA CUS TA. EM 1825 Anotámos, na Sacristia, de valor artístico, os seguintes objectos cultuais-sumptuários: Cálice, de prata dourada, da 2.ª metade do séc. XVI, com decoração de motivos renascentistas e barrocos, gravados no nó, base e copa (alt. 23 cm). Naveta, de prata cinzelada e desenho naturalista, muito curiosa, do séc. XVII (alt. 20 em x comp. máx. 143 mm.). Turíbulo, de prata repuxada e cúpula aberta com temas vegetalistas, da mesma época; Naveta, de latão amarelo, lavrada, do séc. XVIII (vulgar); Turíbulo, de material, tipo e período da peça acima mencionada, de cúpula muito elegante, e Tese, encaixilhada e impressa em Coimbra, no ano de 1753, sob seda vermelha, de conclusões de Teologia Canónica de Francisco Pereira da Cunha Corte-Real. 

O claustro do convento, modesta obra de arquitectura funcional, levantado nos princípios do séc. XVII, compõe-se de cinco tramos com arcos de volta inteira e pilastras de granito, em planta quadrangular suportando uma abóbada de penetrações. As celas dos monges, no primeiro andar, deitam para a quadra, cujas janelas, minúsculas, eram de rústicas padieiras de granito; no centro, entre placas floridas, ergue-se o tanque e fonte da Água da Prata, de mármore branco de Estremoz, que foi inaugurado em Dezembro de 1619, por anel concedido pelo rei Filipe III de Espanha. O obelisco, muito curioso, compõe-se de balaústre circular com taça, donde rompe uma pira ornamentada de quatro águias de asas abertas sobrepujada por pinha estilizada. Dois painéis de azulejos policromos, de primitivos altares, hoje obstruídos, subsistem no recinto, em composições típicas do barroco e armorejadas com o emblema carmelita (2.° terço do séc. XVII). Em nicho de opulentas volutas de estuque, sobrepujante ao portal de acesso à sacristia, demora interessante, embora maltratada escultura de madeira de S. João Nepomuceno, proveniente da igreja Colegiada de Santo Antão. No pavimento, feito com lages de pedra e de placas de ardósia, sob campas tumulares ricamente brasonadas, de mármore e granizo, jazem alguns varões seiscentistas. Algumas estão anepígrafas; outras têm os letreiros completamente apagados, mas conseguem-se ler as seguintes: S.A PERPETVA DO CAPI TÃO LVIS PERDIGÃO BOCARRO F.CO EM DIA DO CORPO DE DS. DE 644 E DE SVA M.O IZA BEL PR.A SOTO, E P.A QEM ELLA QVIZER SEPVLTVRA PERPE TVA DE SEBASTIÃO RIBEIRO DE FARIA CA VALEIRO PROFESSO D O ÃBITTO DE CHRISTO E DE SVA MOLHER CAT ERINA MASCARENHAS E DE SEVS HERDEIROS S. D. FERNÃO DE LEMOS.D.S.M.O LVI ZA DA CVNHA. D S. ERDROS. FALEC.O A.3.D.MAIO.D.1623 SEPVLTVRA DE A.O GO MEZ E DE SVA MOLHER AMA LIA DA COSTA E DE SEVS ER DEIROS Das duas restantes campas armorejadas, de impossível leitura, do chão da claustra, uma ostenta o brasão dos Lemos e a outra não nos foi possível identificá-la. Segundo planta aprovada pelo Pe. Geral fr. António de Santo Eliseu, no mosteiro de Carnide, sede da Ordem em Portugal, no ano de 1710, o edifício foi ampliado com o novo Dormitório e outras melhorias necessárias, sendo nelas compreendidos o Refeitório e a Sala Capitular. 

Naquela dependência apenas escapou às adaptações do actual necrotério, um lavabo de mármore emoldurado, com o emblema da Ordem, da 2.ª metade do séc. XVIII. O Capitulo conserva o banco corrido da comunidade, de madeira, e o altar fundeiro com incaracterística e pobre tela de S. Bernardo adorando a Virgem do Leite; numa parede está embebido o cenotáfio do padre fr. Sebastião da Conceição, Geral dos Carmelitas, finado em 1733, que em lápide de mármore branco conserva este epitáfio: AQUI ESTÁ SEPULTADO O M.R.P.FR.SEB.AM DA CONCE IÇÃO (CALDEIRA DE BRITO) RELIG.O CARM.TA DES ÇO, O QUAL DEPOIS DE SER BENEMERITO PRELADO DE M.TOS CONV.TOS DESTA PROV.A PROV.AL DE TODA ELLA E DEFINIDOR G.AL FOI DIG NI.MO G.AL DA CONGREGA ÇAM DEL.A ESP.A CUJA SUPREMA PRELAZI A RECTISSIMA M. T.E E XERCITOU POR ESPA ÇO DE 6 AN. SENDO... Q P.A ELLA FOI ELEITO DES TA M.A PROV.A DE PORTUGA L. ERA N.AL DA V.A DA CERTÃ A FALECEO A 8 DE 7BRO DE 1733. ESTE LETER.O MAND OU FAZER SEU SOBR.O AN T.O PEIXOTO DE BRITO E SA RABODES F.O DO D.OR M.EL MENDES MEXIA PROV.OR Q. FOI NESTA CID.A DEV.A E M.OR NA DE PORTALEGRE Na cerca do Cemitério existe, por reconstituição de 1840, o majestoso portal de mármore róseo, regional, do Renascimento, proveniente da demolida igreja do Convento de S. Domingos. A notável peça está cronografada de 1537-38 e compõe-se de elementos decorativos do estilo clássico francês, com suas belas e expressivas máscaras antropomórficas e panóplias em baixo-relevo. 

É atribuível, segundo o prof. Reinaldo dos Santos, ao escultor picardo Nicolau Chaterene, artista que trabalhou nesta casa monástica, seguramente, no princípio do 2.° terço do séc. XVI, conforme a lição dos documentos coevos. Das edículas posteriores saíram para o Museu Regional, em 1944, duas boas imagens de mármore branco, quinhentistas, representando a Virgem em Adoração, gótica, e o Salvador do Mundo, mais tardia e da época presumível de D. João III. Do edifício e para a mesma secção arqueológica foi, também, uma preciosa escultura da Santíssima Trindade, de pedra de Ançã, com as características do gótico recentista da famosa Escola Eborense de escultura medieval. De merecimento recomendam-se, ainda, as seguintes imagens que, denominando os funéreos talhões e provenientes ao que a tradição afirma dos extintos Conventos de S. Domingos, N.ª S.ª da Graça e Cartuxa, subsistem sobrepujantes a formosos capitéis e colunas marmóreos do estilo clássico e das ordens jónica, dórica e toscana: Nossa Senhora dos Remédios, séc. XVI (interessante); Nossa Senhora do Leite, séc. XVI (de encostar); S. José e o Menino (mutilada e de factura inferior); S. João Baptista (mutilado e de execução inferior); S. Bruno, séc. XVII; S. Francisco Xavier, escultura barroca, do séc. XVIII. São todas de mármore branco de Estremoz. 

BIBL. Pe. Francisco da Fonseca, Évora Gloriosa, 1728, págs. 379-81; Pe. António Franco, Évora Ilustrada, 1945, págs. 359-363; Gabriel Pereira, Estudos Eborenses, fasc. Os Assédios de Évora em 1663, 1.ª parte, 1889; Túlio Espanca, Património Artístico do Concelho de Évora, 1957, págs. 49-54; Robert Smith, A Talha em Portugal, 1963. 

domingo, 3 de setembro de 2017

Convento da Cartuxa


A fundação do vasto mosteiro, da Ordem de S. Bruno, dedicado à Virgem Maria com a denominação de Scala Coeli e o decano da mesma em Portugal, deveu-se ao ilustríssimo arcebispo de Évora, D. Teotónio de Bragança, derradeiro filho dos duques D. Jaime, 3.° deste título e de sua esposa D. Joana de Mendonça. Obtida licença do Grão Prior D. Jerónimo Marchant e escolhido o local da construção, do Mosteiro do Castelo de Morea, no arcebispado de Tarragona, saíram os fundadores D. Luís Telmo, 1.° prior de Évora, D. Jerónimo Ardion, D. Francisco de Monroy, monges do hábito e os conversos fr. Silvestre, fr. João de Vellis e fr. Paulo, todos catalãos, que deram entrada nesta cidade no dia 8 de Dezembro de 1587. Como a obra, modelada com a grandeza peculiar da regra se devia arrastar pelo espaço de alguns anos, o prelado obteve do primo Filipe II de Espanha autorização para que os religiosos se aboletassem em parte do Palácio Real de S. Francisco, desocupado pela ausência da corte em Madrid e, afinal, jamais utilizado pelos futuros monarcas portugueses. No dia 15 de Dezembro de 1598 inaugurou-se a nova casa de Deus, em seguida à leitura de doação do edifício e terrenos adjacentes, com simultânea aposentação dos mesmos monges. Na data da morte de D. Teotónio, ocorrida em 29 de Julho de 1602, na cidade de Valladolid, encontrando-se, o cenóbio numa fase muito adiantada de construção, verificou-se que os gastos dele ultrapassavam os 150 000 cruzados de rendimentos pessoais do fundador. 

O píissimo antístite deixou todos os seus bens à novel ordem, a qual, em sinal de reconhecimento pela sua memória, em carta dimanada do D. Prior Geral de S. Bruno, ofereceu in infinitum, ao Duque de Bragança, D. Teodósio II, sobrinho do instituidor, o chão sagrado do templo para panteão da Sereníssima Casa, diligências que embora aprovadas por ambas as partes, não teve seguimento. Durante os cercos de Évora em Maio e Junho de 1663, o convento foi vítima das vicissitudes da guerra e serviu de hospital de sangue: a sua primitiva igreja, edificada com explendor, conforme os desejos do padroeiro, foi incendiada depois de todo o edifício ter sido ocupado pelo corpo de 3 000 cavalos de D. Diogo Cabalero e, dos elementos originais da sua arquitectura, somente se aproveitou o nobre pórtico de mármore, do estilo clássico. Perante esta calamitosa situação, a comunidade instou, junto de D. Pedro II, como legítimo sucessor do ducado brigantino, para aceitação do padroado da nova igreja, conforme documento de petição feito pelo D. Prior Sebastião da Madre de Deus, em anuência que caiu sobre o herdeiro da coroa, o príncipe do Brasil D. João. O auto público foi lavrado em Lisboa no dia 17 de Fevereiro de 1701. Desta forma, a coroa subsidiou largamente o levantamento do novo templo, e na primeira fase do restauro, no priorado de D. Bernardo de S. José, o rei concedeu a verba de 26 000 cruzados, acrescidos posteriormente, já no governo de D. João V, com 5 000 cruzados para douramento do imponente retábulo de talhas policromas do altar-mor, obra notável devida aos artistas eborenses, irmãos Abreu do Ó. Extinta a comunidade em Maio de 1834, o edifício foi salvo da hasta pública pelo deputado eborense Joaquim Filipe de Soure, que nele sugeriu a criação de uma Escola Agrícola Regional que, após vicissitudes várias, se criou na sua cerca, segundo letra do Decreto de 16 de Dezembro de 1852. Com a extinção desta em Abril de 1869, o convento e terras anexas foram vendidos pelo Estado, por 23 001$00 a José Maria Eugénio de Almeida, representado actualmente pelo eng. Vasco Maria Eugénio de Almeida, descendente directo e seu legítimo proprietário. 

No ano de 1960 a comunidade cartuxa, igualmente representada por religiosos espanhóis, como os fundadores, e a consentimento arquiepiscopal de D. Manuel Trindade Salgueiro, arcebispo de Évora, por renúncia voluntária com cláusulas específicas daquele donatário, voltou a ocupar o edifício e todos os seus anexos sob guardiania interina de frei Ludolfo Maria Urbano. Todavia, só em Junho de 1963 a Ordem elegeu D. Pedro de Sotto Domeq, ex-conde de Puertohermoso (D. Pedro de Santa Maria), como seu 1.° D. Prior da 2.ª vigência claustral. De entre um espólio de excepcional beleza artística e valor material destacavam-se, do fundo primitivo do cenóbio, 134 painéis de pintura, incluindo doze em tábua, estes possivelmente do séc. XVI, que, após o inventário do delegado do Governo, dr. António Nunes de Carvalho, se arruinaram numa dependência do mosteiro por desabamento do telhado e em cujo núcleo deveria estar o retábulo flamengo do Calvário, que esteve originariamente no claustro e serviu de modelo ao célebre conjunto da Chartreuse de Champmol, perto de Dijon, denominado Puits de Mise, de Claus Sluter (1601); a notabilíssima Livraria, em fundo especial doada pelo arcebispo D. Teotónio, em 1602, vendida, em parte, ao desbarato depois de 1834 e pequeno núcleo de manuscritos recolhidos na Biblioteca Nacional de Lisboa, onde são jóias inapreciáveis o apógrafo do Leal Conselheiro, de D. Duarte, e o célebre Atlas, de Fernão Vaz Dourado, de 1571; e, ainda, a grande banqueta do altar-mor, que se vê hoje na capela-mor da Catedral, executada pelo entalhador eborense António José Coelho, pouco depois de 1808, para substituir a antiga, de prata, que os franceses de Loison pilharam durante o assalto da cidade. A dois arquitectos italianos, segundo a moderna interpretação crítica, foi dada a autoria e planta da igreja da Cartuxa: a Filipe Terzi e a Giovanni Vicenzo Casali, o primeiro, artista muito conhecido em Portugal e o segundo, mestre florentino nomeado por Filipe II, em 1586, para estudar e dirigir a obra de fortificação do reino. Todavia, a fachada é nitidamente inspirada numa gravura do Libro extraordinário delle porte, de Sebastião Sérlio, publicado no ano de 1537. 

Ignorando-se ao presente até que ponto as destruições afectaram a estrutura do templo antigo e sabendo-se que todo o corpo superior foi terminado nos primeiros anos do séc. XVIII, dentro do espírito clássico original e não havendo documentos autênticos que testemunhem a paternidade do tracista do edifício, parece prudente, até surgirem fontes informativas dignas de fé, que fique em suspenso o seu estudo arquitectónico. Ao transpor-se um dos vãos da arcada do Aqueduto da Água da Prata, que lhe serve de limite territorial, na linha da Estrada Nacional 370, penetra-se na cerca do convento, que é antecedido por austero alpendre ou portaria exterior, de vergas almofadadas, graníticas, terminado por frontão sem retorno com obeliscos aguçados, nos remates, ao gosto barroco. Sob o tímpano corre a seguinte legenda votiva, gravada em placa de mármore: EREMOS DEI PARE VIRGINIS MARIAE SCALA COELI ORDINIS CARTUSIANORUM 1604 No vasto terreiro da igreja e ligado com oficinas monásticas, à mão esquerda, de sóbria frontaria de um piso, ultimamente restaurado, fica o corpo da antiga hospedaria dos monges brancos, que foi ocupado até há pouco tempo pelos proprietários do imóvel. A fachada do templo, na linha meridional, levanta-se com singular majestade na coroação de três andares da Renascença clássica, de mármores estremocenses brancos e de almofadas cinzentas nos planos superiores, intervalando a colunata. O pórtico, da ordem dórica, dispõe-se com colunas estriadas e friso de triglifos e metopas aberto por cinco arcos de volta perfeita e balaustrada nos vãos centrais, entre os tramos da escadaria, que é lançada espaçadamente em oito lanços. O alçado imediato, onde se abrem três janelões de perfis rectangulares é do estilo jónico, e o último andar está desenhado na ordem compósita, terminado nos acrotérios por pináculos e aletas barrocos que centram, em nichos (os únicos preenchidos), as imagens de S. Bruno, S. João Baptista e a Virgem Maria, todas de mármore branco de Estremoz. No tímpano propriamente dito, corre o escudo de armas de D. Pedro II, monarca que terminou a obra monumental da igreja, arruinada durante a Guerra da Restauração. 

Tem o alpendre, apoiado em abóbada de penetrações, três curiosos portais de mármore: os laterais, de empenas circulares, comunicam com a portaria e claustro das Capelas ou dos Irmãos. O portado central, de dintel cortado, com aletas rodeando o armorial da Ordem, de secção ovóide, mais belo e amplo, dá acesso ao templo. Este é de planta rectangular e de uma só nave com abóbada de berço, iluminada pujantemente por dez janelões rectangulares, outrora emoldurados por entalhados da arte barroca. Divide-se a igreja em três corpos distintos: capela-mor, nave e santuário dos irmãos. Esta última secção, a única franqueada ao público durante os ofícios divinos, mas em espaço separado por uma formosa teia de balaústres torcidos, de madeira do Brasil, compreende interessante recinto fechado com portal de mármore e tendo dois altares colaterais, de talha dourada e de colunas salomónicas ornamentadas por cachos de flores e frutos, apoiadas em querubins. Dosséis de madeiras coloridas, rematam as capelas, as quais, actualmente despidas de imaginária, tiveram os patronímicos de Santo António e Santa Bárbara. São bons exemplares barrocos de c.ª 1700. Nas paredes laterais do mesmo recinto, abrem-se dois riquíssimos exemplares de armários-lavabos, de mármores embrechados e de opulentos frontões de enrolamento e, aos lados, sob estrados, interessante cadeirado da mesma época, de talha, para doze irmãos, com altas espaldas agora desmontadas. Nos tramos correspondentes à nave da comunidade, servindo de coro, corre opulento cadeiral de madeiras de carvalho e castanho, destinado a 48 religiosos, estando decorado por guarnição barroca de fachos candentes, tabelas e pilastras de serafins esculturados, que se encontra muito arruinado por ter estado, em épocas antigas e depois da profanação da igreja, completamente coberto de cereais. Doze enormes molduras de talha dourada, decoradas por serafins e cartelas armorejadas, da ordem cartusiana, do séc. XVIII, preenchem os vãos das janelas: das telas, representando cenas da vida de S. Bruno ou de Nossa Senhora (?), desconhece-se o paradeiro, tudo parecendo indicar que se perderam comummente aos 134 quadros depositados em dependência do convento, pouco depois de 1836, numa fatal derrocada de telhados arruinados. 

A capela-mor, pouco profunda mas bastante alta, aberta por imponente arco triunfal de volta perfeita, de mármore fino de região, decorado com as armas de Portugal, ostenta um túrgido, volumoso e pomposo retábulo de talhas douradas e policromas, devido a desenhos e execução dos artistas Abreu do Ó, componentes de uma operosa dinastia de bons artífices de ensamblador, de escultura e entalhamento, que inundaram a região de magníficas obras de arte do género durante todo o século XVIII. A notável obra de marcenaria artística, executada ao gosto barroco, de volumes e formas pesadas e complicadas, mostrando no remate cimeiro o armorial da casa, está sobrecarregada de ornatos com grinaldas compactas de frutos e flores, de cornucópias sustentadas por serafins papudos, entre agigantadas aletas, cartelas, volutas, nichos e opulentas pregas de talhas esculpidas em alto-relevo. "A composição abrange um só andar; as colunas ocupam mísulas ricamente esculpidas com folhas de acanto que sugerem plumagem, dispostas de tal forma que, no centro de cada mísula, se abre um lugar vazio, descrevendo rudimentarmente a forma de um coração. Além disso, as colunas exteriores são consideravelmente avançadas, dando ao retábulo a sugestão de concavidades e, por isso, de movimento. A tribuna é ocupada por um trono em forma de pirâmide e encimada por uma coroa real sustentada por anjos volantes, segundo um padrão largamente seguido. O sacrário, de estilo arquitectónico, combina-o com um par de edículas por baixo da tribuna. Em cima da tribuna aparece uma terceira, reproduzindo em miniatura a forma do retábulo, provavelmente por influência espanhola, pois esse foi um modelo comum naquele país no fim do séc. XVII. No retábulo da Cartuxa, porém, o motivo é devidamente subordinado a dois arcos concêntricos que cingem o remate, fechando o perfil, à moda portuguesa, estabelecendo a harmonia compacta, visível em retábulos completamente evoluídos, como os do mosteiro novo de Santa Clara, de Coimbra e N.ª S.ª da Conceição, de Cardais". (Robert Smith). 

O altar já estava terminado em 1729, data em que para efeito de douramento D. João V, desvelado protector do mosteiro, como seu pai, el-rei D. Pedro II, lhe atribuiu a dotação de 5 000 cruzados. O profanamento da igreja, nos meados do século passado e as infiltrações de águas provocadas pela ruína do terraço do campanário, sobrepujante aos telhados, causaram profundos males ao extraordinário retábulo, que só principiou a ser olhado carinhosamente pelo último proprietário. Este conjunto, de proporções excepcionais e de um barroquismo perturbante, embora de traça complexa, não tem similar no sul do País. Assenta, a pesada massa de talha, numa base e altar de mármores embutidos, policromos, finamente caligrafados, semelhante aos do tapete pavimentar, este no sistema de apainelado de mosaicos do tipo italiano vulgarmente designado de estilo florentino. O claustro das Capelas, na banda ocidental do edifício, está completo e foi construído nos princípios do séc. XVII: é de planta quadrada, de três tramos com arcadas de meio ponto reforçados exteriormente por pilastras de granito. A abóbada tem nervuras levemente emolduradas e as paredes estão revestidas por alto rodapé de azulejos barrocos de esmalte azul e branco, com figuração de golfinhos e albarradas. Ao centro da quadra existe discreta fonte e taça de mármore branco, sendo o obelisco decorado por quatro carrancas antropomórficas; no terraço, contra o lado ocidental, abre-se na espessura da parede um interessante relógio de sol, esgrafitado e com moldura de friso vegetalista, coetâneo. As mais nobres e importantes dependências do real mosteiro ficavam neste claustrim: o Refeitório, Sala Capitular, Capela de S. Bruno e santuários tumulares de figuras de algo da religião, que desejaram repousar eternamente sob protecção dos monges brancos. 

Na primeira sala da mão esquerda (topo fundeiro), muito ampla e de tecto de berço, existiu num nicho de baldaquinete com composição a fresco, a venerável imagem de S. Bruno, que se expõe no presente oratório público, moderno, do exterior da comunidade. Contra o lado norte vêem-se três capelinhas do séc. XVII desta forma distribuídas: 1.ª - Actual sacristia, com algum mobiliário antigo mas sem mérito artístico; 2.ª - A tumular de António Simões Barreiros, que é muito curiosa, com seu tecto e prospectos de cimalhetes pintados a fresco e apainelados cegos, onde existiram retábulos. Atingindo as cimalhas, desde o solo, corre em forramento uma quente padronagem de azulejos policromos, do tipo de tapete, semelhantes aos da capela de S. Joãozinho, anexa à igreja conventual de S. Francisco, da cidade. Encontra-se aqui reunida uma curiosa série de esculturas de madeira, estofadas e douradas, e provenientes, na sua maioria, dos altares do extinto Convento da Cartuxa. As melhores são uma Santa Bárbara, do antigo altar da capela dos Irmãos, e S. João Baptista, ambas do período joanino. A campa do padroeiro, de mármore branco, tem legenda latina: 1645 ANTONIVS SIMMOIS BARR EIROS § QVIES C IT IN SPE § 3.ª - A última capela, nas mesmas dimensões e características, foi do padroado do cónego capitular da Catedral, Domingos Martins. Conserva a primitiva guarnição de azulejos enxaquetados, de esmalte verde e branco nas paredes, e o tecto é lavrado em caixotões com vestígios de pinturas murais. É obra dos começos do séc. XVII. A jazida, no meio do pavimento, em lâmina de ardósia, está rodeada por fieira de azulejos pavimentares, certamente castelhanos, de relevo e coloridos, ainda de fabrico quinhentista. Tem a seguinte inscrição, em português: REQVIESCAT IN PACE S.A DO DOVTOR D.OS MARTIS ARCI DIAGO DE OVRI OLA E CONEGO QVE FOI DA SE DESTA CIDADE DE EVORA O Q. AL DOTOV ESTA CAP.A ...DE JVL:O D 1610 Todos estes santuários possuem, nas respectivas janelas, os primitivos vitrais, verdes e de armações de chumbo, exemplares bem raros hoje em Évora. Na parede fronteira à entrada da actual capela (antiga Sacristia e Relicário), admira-se um dos mais representativos modelos de lavabos barrocos da cidade, facturado em mármore branco regional. Pequeno nicho com a imagem de S. Bruno (moderna), antecede a portaria desta dependência, onde se celebram normalmente os actos religiosos. É de planta rectangular, com abóbada de penetrações e paredes lisas, toda caiada de branco, onde se montou resto de um cadeiral da época seiscentista, proveniente da Sala do Capítulo, e nos alçados medíocre Via Sacra, pintada a óleo sobre tela, muito mais moderna e adquirida no bric-à-brac. O retábulo é um precioso exemplar de madeira dourada e laçada, do classicismo maneirista, datável de c.ª 1590 e ainda do tempo do fundador D. Teotónio de Bragança, axialmente iluminado pelo Calvário, que a tradição popular baptizou de Senhor Jesus da Cartuxa. Versão do motivo de edícula, tem duas pilastras jónicas longas e perfuradas por três zonas de nichos, ornados de pequenas esculturas de madeira estofada, de santos e profetas, quiçá coetâneos. A empena, aberta e do tipo serliano, com friso dórico, é requinte raro de academismo na talha portuguesa, embora frequente na espanhola, de que parece ser uma interpretação bastante livre com raízes na Cartuxa de Miraflores, de Burgos. 

Na nave e sobre móveis antigos subsistem alguns objectos sacros: banqueta, ex-votos pintados sobre tábua, camândulas gigantescas, tocheiros e as esculturas estofadas e douradas de S. Bruno e Santo António (esta proveniente da capela dos Irmãos). O restante mobiliário, algum muito bom, dos estilos holandês e português dos sécs. XVIII-XIX, foi sempre do património avoengo dos proprietários do edifício. A claustra grande, exemplar sóbrio de arquitectura barroca, concluído na governação do operoso prior D. Basílio de Faria, no 1.º quartel do séc. XVII, compõe-se de uma arcada em alvenaria de volta perfeita, de singulares proporções em Portugal, com cem metros e 19 arcos por banda. Parece que no período da Guerra da Independência, em 1663, sofreu muito com os bombardeamentos do general de artilharia castelhano, Marquês de Almenara. No meio do recinto ergue-se uma elegante fonte de três taças sobrepostas, circulares, de mármore regional, cujas águas caem em tanques de configuração romboide e servem para regadio do grande laranjal, ao presente novamente plantado com disposição regular, geométrica. No ângulo ocidental do claustro fica o cemitério fradesco, ao presente reconstituído, onde estiveram até 1839, sob campa marmórea e única, as cinzas de D. Basílio e de seu sobrinho e chantre Manuel Severim de Faria, nesta data trasladadas para a nave da Catedral, onde se encontram. Os monges cumpriam os votos de clausura, segundo o estatuído na regra, no mais absoluto isolamento e assim, cada religioso vivia na sua cela sem contacto com os irmãos do hábito branco, moradia que se compunha de cinco divisões distribuídas pelo rés-do-chão, primeiro andar e quintal privativo, onde existia, além de um alpendre de arcos de granito, um tanque para lavagem e fonte de repuxo, abastecido por canos construídos ao ar livre no remate dos muros exteriores Estes comunicavam com o aqueduto do profundo poço de cantaria aparelhada, do séc. XVII, que ainda existe, intacto, na cerca, para o lado da cidade. O poço é coberto por alpendre de quatro arcos e num dos ângulos, tem escada helicoidal que atinge o terraço, o qual esteve envolvido por curiosa galeria de arcada coberta, perdida por desabamento pouco depois de 1933. Sobranceiro fica o corpo da cela do padre prior, cujas dependências, assim como as restantes do mosteiro, foram ultimamente reconstituídas: o centro do claustro menor, deste lado, erguido desde os fundamentos segundo vestígios encontrados serviu, durante longos anos de depósito de águas pluviais destinadas ao regadio dos pomares vizinhos e se concebera como caixa de futura cisterna. Nos extremos do corpo alto do claustro principal, voltados para o lado norte, subsistem os restos de duas galerias que possuíam arcadas e frontões de alvenaria e se arruinaram nos tempos modernos. 

Na do lado oriental, uma vasta dependência de dois andares, com fogão, pavimento e coberturas desmoronados, serviu de Livraria, no andar superior, e de Calabouço no inferior, como sugerem alguns autores. António Francisco Barata, que no edifício compôs o seu romance da série eborense A Beata de Évora, na outra obra O Último Cartuxo, publicado em 1891 sob o pseudónimo de D. Bruno da Silva, coloca romanescamente o cárcere na cripta da igreja. Subindo ao terraço do templo por escada de rampas, chega-se ao campanário, que é de duas espadanas e possui um sino de bronze antigo e uma sineta moderna. Um terceiro campanil, sobrepujante, foi destruído por uma faísca no ano de 1931. O primeiro sino tem esculpidos a cruz de Cristo, a imagem de S. João Baptista e a legenda: FOI ESTE SINO FUNDIDO NO ANO DE 1821 SENDO PRIOR O MTO.REV.DO P. D.B.S.M.N. SAM JOAN BAPTISTA ORA PRONOBIS PEDRO PAULUS AMDEU ME FEZE. Nos ângulos meridionais, interiores, do claustro, nos fechos da abóbada, embora irreparavelmente atingidos pela humidade, conservam-se ainda formosos e opulentos armoriais pintados a fresco, da época barroca, com figuração heráldica da monarquia dualista dos Filipes de Áustria, do 2.° terço do seiscentismo. Duas peças de arte valiosas do fundo antigo da casa religiosa, que se encontravam, ultimamente, depositadas pelo Estado na Igreja de S. Francisco voltaram ao domínio original, e são elas: S. Bruno, belíssima escultura de madeira de castanho, estofada e dourada, da 1.ª metade do séc. XVII. Figurou na Exposição de Arte Portuguesa da Royal Academy of Arts, de Londres, em 1955. Alt. 1,64 m. Cadeira do Dom Prior da Cartuxa. Móvel do estilo barroco português dos começos do séc. XVIII. Época de D. Pedro II. Madeira exótica do Brasil, de talha esculpida, com braços de volutas e espaldar alto, apainelado, de remate enconchado e de pináculos. Pés recurvos, de garras estilizadas. A cavaleiro de discreto aterro do lado ocidental, na cota mais elevada da cerca da Cartuxa, ergue-se a caixa de água e o simples cano de arcaria que abasteceu a comunidade e cujo anel lhe foi concedido pelo rei Prudente de Espanha, a instâncias do arcebispo fundador, D. Teotónio de Bragança, segundo Alvará de 20 de Fevereiro de 1592. 

A pequena edificação oferece características do séc. XVII e está ligada ao Aqueduto da Água da Prata por uma torrinha quadrangular de cúpula cónica ladeada de quatro pequenos torreões do mesmo tipo, da obra renascentista dos arquitectos Francisco de Arruda ou Diogo de Torralva, feita nos meados do quinhentismo. O depósito distribuidor, de planta rectangular, é aberto por quatro arcos de volta abatida ornamentados por aletas barrocas, de alvenaria, e tem eirado com varanda e lanternim. No vasto terreno murado dos antigos domínios dos cartuxos, conservam-se duas lagoas onde a comunidade creava em viveiros permanentes, para fins alimentares, produção de cágados, única espécie carnívora que a regra autorizava para consumo. Na habitação do sr. eng. Vasco Maria Eugénio de Almeida, anexo ao edifício conventual, existem algumas peças antigas de merecimento das Artes Decorativas, cumprindo assinalar, pela sua singularidade as seguintes: a) Série de panos de armar, muito notáveis, tecidos em Bruxelas no séc. XVIII, representando cenas da VIDA DO IMPERADOR MARCO AURÉLIO, que são: 1.° TRIOMPHVS M. AVRELII - medindo 3,20 de alto, por 4,90 m. de comprimento. 2.° CORONATIO M. AVRELII - medindo 3,20 m. de alto por 3,80 m. de comprimento. 3.° M. AVRELIVS REPREHENDIT FAVSTINAM - que mede 3,20 m. de alto por 3,15 m. de comprimento. b) ARMÁRIO, do tipo holandês, no estilo de transição clássico-barroco - sécs. XVII-XVIII. Volumosa peça de madeiras exóticas, com frisos e portas decorados por elementos florais e animais selvagens, em baixo-relevo. A frente tem meias colunas salomónicas e capitéis de fantasia ao gosto da Renascença. No friso superior dois atlantes amparam um escudo liso. Bases de três leões em alto-relevo, afrontados (1). 

BIBL. Pe. Francisco da Fonseca, Évora Gloriosa, 1728, págs. 377-378; pe. António Franco, Évora Ilustrada, ed. Nazareth, 1946, págs. 357-359; António F. Barata, Breve memória histórica sobre a fundação e existência até ao presente da Cartuxa de Évora, 1888; António F. Barata, Évora Antiga, 1909; Reinaldo dos Santos e Raul Proença, Guia de Portugal, 1927; João Rosa, Alentejo à Janela do Passado, 1940; Túlio Espanca, Património Artístico do Concelho de Évora, 1957, págs. 22-29; Robert Smith, A Talha em Portugal, 1963. (1) Ultimamente, estes objectos ornamentais foram removidos - as tapeçarias, para o antigo paço dos Condes de Basto e o móvel para a quinta de Valbom, residências ambas do Conde de Vilalva. 


quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Luísa Sobral em Évora


Horário: 22h
Evento: 17 agosto
Localização: Praça do Giraldo

Após ter vivido por 4 anos nos EUA, Luísa Sobral estreou-se em 2011 com a edição de “The Cherry on My Cake”, um álbum bem recebido pelo público e pela crítica. Seguiu-se “There’s A Flower In My Bedroom” (2013), com 17 canções e prestigiados convidados, como Jamie Cullum e os portugueses António Zambujo e Mário Laginha. A sua discografia conta ainda com “Lu-Pu-I-Pi-Sa-Pa”, editado em 2014, que expande o seu universo para fora dos limites estéticos dos seus dois primeiros discos.
“Luísa” é o quarto álbum de originais de Luísa Sobral, editado em 2016 e agora apresentado ao vivo. Neste disco estreitam-se a cumplicidade e os laços afetivos com quem ouve, em novas canções e letras tocantes, que a colocam num novo patamar de maturidade criativa: ainda mais segura, exigente, autêntica e espontânea.
Compôs a música Amar pelos dois, interpretada pelo seu irmão Salvador Sobral, que ganhou o Festival Eurovisão da Canção 2017.
Org: Câmara Municipal de Évora​
Inserido na programação do Festival "Artes à Rua"

Informação retirada daqui

segunda-feira, 3 de julho de 2017

A primeira edição do Iberian Porsche Meeting decorre em Évora de 8 e 9 de julho


O maior encontro de desportivos Porsche da Península Ibérica encontra-se praticamente lotado. Clientes e aficionados da icónica marca alemã não faltaram a esta inédita chamada e aderiram em peso ao grande evento que terá lugar em Cascais, Évora e Portimão, no fim de semana de 8 e 9 de julho.

Por preencher resta um número de vagas muito reduzido inserido no 'Pack Sport', o nível de participação mais acessível — um facto que deixa a organização do Iberian Porsche Meeting "muitíssimo satisfeita", avança Pedro Marreiros: "Contávamos atingir o nosso objetivo até meio do mês de junho e a verdade é que fomos surpreendidos com a adesão maciça dos nossos clientes, que não quiseram perder a possibilidade de participarem num programa de atividades extremamente dinâmico. No final de abril já tínhamos esgotado o 'Pack Sport Plus' e contamos neste momento com pouquíssimas inscrições para o 'Pack Sport', que contempla o desfile na Marina de Cascais e o desfile pela vila", revela o CEO da Prime Promotion, a empresa encarregue de organizar o certame.

Dentro do leque de viaturas já confirmadas estão "quatro Porsche 911 GT3 RS, alguns clássicos de eleição que irão dar um colorido muito especial ao Iberian Porsche Meeting e um rol de surpresas que não queremos, para já, desvendar", salienta o mesmo responsável, que aproveita igualmente para destacar o "enorme entusiasmo dos aficionados e clientes que residem na vizinha Espanha", tendo também eles confirmado a sua presença neste histórico encontro de desportivos Porsche.

Acima das melhores expetativas, "a verdade é que o objetivo delineado para esta fase foi largamente cumprido", reforça Pedro Marreiros, não escondendo que "a confirmação da presença de Mark Webber no Iberian Porsche Meeting fez com que muitos proprietários quisessem garantir imediatamente o seu lugar".

A realizar alternadamente em Portugal e Espanha, o Iberian Porsche Meeting é um evento anual que tem como objetivo reunir num mesmo espaço o maior leque de desportivos Porsche da Península Ibérica. Dirigido a proprietários, potenciais clientes e aficionados da marca, a primeira edição tem lugar no fim de semana de 8 e 9 de julho, e conta com a presença do antigo piloto de Fórmula 1 e campeão do WEC, Mark Webber. Reúne o apoio das Câmaras Municipais de Cascais, Évora e Portimão, e integra um conjunto de atividades desportivas.