quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Évora - ... do mundo romântico à ordem republicana ...

 


O Recenseamento Eleitoral de 1911 revelou que a população do concelho se cifrava nos 26.663 residentes. Nas quatro freguesias urbanas viviam 17.907 pessoas, enquanto nas rurais habitavam as outras 8.764. A freguesia da Sé era a mais populosa, com 7.542 almas. Toda esta sociedade era caracterizada por uma mentalidade feudal, conservadora, submetida a um estratificação social praticamente asfixiante e que poucas alterações conheceu com o advento do liberalismo, o qual na prática se limitou a substituir a nobreza pela burguesia enquanto classe dominante e dominadora.

No concelho, as grandes propriedades passaram para as mãos de poderosos médicos, militares, bacharéis, negociantes e comerciantes, enquanto o clero secular vai sendo afastado dos conventos, vendidos ou adaptados a outros fins. No resto do país sucede o mesmo. O historiador Oliveira Martins, na sua obra “Portugal Contemporâneo”, sublinha que «à ordem clerical-nobiliárquica, se segue a da oligarquia fundiária de mãos dadas com a também nova oligarquia bancária». A servir de exemplo entre nós veja-se, em espaço próprio, como foram constituídos e quem eram os principais accionistas do Banco do Alentejo e do Banco Eborense, ambos formados em 1875.

Em “Viagens na Minha Terra”, escrito em 1846, já Almeida Garrett afirmava com convicção: «A sociedade já não é o que foi, não pode tornar a ser o que era; mas muito menos ainda pode ser o que é» . Por essa altura a burguesia eborense, avessa à vivência nos asfixiantes espaços domésticos, procurava encontrar no exterior espaços onde reunir, conversar, trocar ideias e debater o que se passava no Parlamento, o fórum nacional e público. 

Assim nascem as sociedades de recreio ligadas aos partidos formados após a Regeneração, movimento que modernizou o país e trouxe para a vida comum a filosofia do romantismo, marcado pela idealização, pela evasão, pelo sonho e pelo escapismo. As festas burguesas eram assim marcadas pela futilidade, pelo aparato superficial das senhoras e pelo perfil rotundo e balofo dos respectivos maridos, de bolsos bem recheados mas quantas vezes prenhes de intensa ignorância. As sociedades organizavam bailes a qualquer pretexto, sessões de poesia a cargo de bardos que faziam do amor melancólico o seu único tema e no Passeio Público desfilavam vaidades masculinas e femininas. Em recantos escondidos nestes sítios elegantes jogava-se à batota mais reles e despudorada. 

Apenas a paixão pelo teatro, que nesta cidade rebentou com grande autenticidade, e a formação de bandas filarmónicas subsistiam enquanto manifestações culturais de qualidade. Na edição nº.11 de 14 de Fevereiro de 1867 do Jornal “Districto d’Évora”, dirigido por Eça de Queiroz, o futuro escritor, com a acuidade que lhe era peculiar, denunciava esta estrepitosa forma de existência em que «nos esplêndidos salões das camarilhas, nos espaçosos vestíbulos, nos átrios de mármore, o ruído dos trens, o perpassar contínuo dos escudeiros e das escovas dos lacaios, que limpam o verniz das botas, abafam as vozes da multidão que se roja na miséria, que mendiga, que se desmoraliza cada vez mais». 

Diversas referências a este tipo de vida na cidade deixou-as Eça, umas vezes expressas, outras apenas afloradas, igualmente em “O Primo Bazílio” e o “Crime do Padre Amaro”. Tudo isto ocorria com a cumplicidade dos clérigos, que, passado o primeiro impacto da expulsão fradesca, tinham voltado a viver em alegre conúbio com os poderosos. O abastardamento das suas funções e deveres agravou-se a partir de 1870 com a nomeação para Arcebispo de D. José António Pereira Bilhano, um homem já com 69 anos e bastante debilitado, acumulando achaques e mazelas de toda a sorte. Pouco tempo permaneceu em Évora, tendo recolhido a Ílhavo para ali viver o resto dos seus dias.

 Durante cerca de década e meia depois o clero diocesano, com raras excepções, andou à rédea solta sem um superior que lhe fosse à palma. Quando D. Augusto Eduardo Nunes foi nomeado coadjutor do velho prelado ausente, já era tarde para pôr cobro ao vendaval anti-clerical que varria o distrito e o concelho. O ateísmo e o agnosticismo, filhos do cientismo, do positivismo e do relativismo haviam ganho adeptos entre os mais letrados, ao passo que entre o povo crescia a animosidade contra a venalidade dos padres. Reclamava- se o fim da submissão à tutela eclesiástica nos momentos mais significativos da vida de cada um. Neste contexto, fácil se tornou a difusão das ideias socialistas, anarquistas e republicanas que campeavam por todo o lado propondo o fim da ilusória sociedade romântica. A laicização do Estado e o cumprimento dos ambicionados ideais de liberdade, fraternidade e igualdade eram desígnios comuns.


O ano de 1875 foi decisivo para o arranque das primeiras instituições de carácter sindical no concelho, que desde logo entraram em acção. Curtidores de solas e cabedais deram início a uma greve que se prolongou por quatro meses. Outras manifestações de protesto se seguiram e até as costureiras, fartas de tanta exploração, encetaram encontros para fundarem uma organização de classe que não chegaram a concretizar. Nos campos trabalhava-se de sol a sol, o mesmo acontecendo nas lojas e nas fábricas, não havendo direito ao descanso semanal.

Por trás do brilho decadente e fin de siècle das sociedades recreativas e dos clubes de lazer que faziam de Évora uma cidade apetecida, a situação social do concelho era alarmante. Em comunicação apresentada a um colóquio sobre “O Século XIX em Portugal”, organizado em 1979 pelo Gabinete de Investigações Sociais, José Pacheco Pereira, (na altura ainda é só professor de História num liceu de Coimbra) escrevia  que «a criminalidade e o banditismo assumiam as formas características de uma revolta social latente e mesmo nalguns casos, entroncam enquanto movimento social arcaico, em modernas formas de agitação e acção social e política».


Na ordenação por cidades Évora aparece mesmo num pouco lisonjeiro terceiro lugar, apenas atrás de Lisboa e do Porto, num tipo de ilícitos que abrangiam o roubo, a violência contra a propriedade (fogo posto em particular), a vadiagem e a violência contra pessoas (agressões e homicídios). Mas Évora ocupava igualmente lugar de destaque a nível nacional nas estatísticas da prostituição. Em 1900 havia na cidade 57 prostitutas registadas, distribuídas por 7 bordéis numa proporção de uma para 149 residentes, relação só superada pelo Porto e mais elevada que em Lisboa. A maioria das que se dedicavam à sua prática eram costureiras, criadas de servir e «teúdas e manteúdas». E na alta sociedade era moda o adultério, tolerado entre os homens e condenado entre as mulheres. Contra a corrente, um grupo de operários apaixonados pela música fundava nos finais de 1900 o Grupo Operário Joaquim António de Aguiar, afecto à Carbonária.


A reforma dos costumes foi iniciada com a tão discutida e radical Lei da Separação da Igreja e do Estado de 1911. Deixando de parte a questão do património construído que abordaremos noutro espaço, interessa aqui sublinhar a perda de estatuto social dos padres, que se viram afastados do ensino, proibida a realização de procissões e outras manifestações públicas de culto e confinados às suas residências oficiais que passaram ao domínio do estado. Foram abolidos os feriados religiosos e decretado obrigatório para todos o registo oficial civil de nascimentos, casamentos e óbitos, que eram sua prerrogativa, assim como foi aprovado o divórcio. Eliminadas foram ainda as despesas oficiais com o culto e a manutenção do clero, que poderia requerer ao Estado a concessão de pensões permanentes. Em Évora houve exageros e foi penosa a expulsão das Doroteias, que haviam regressado e abandonaram a cidade a 8 de Outubro de 1910.

Para tentar por cobro à criminalidade reinante foi decisiva a formação da Guarda Nacional Republicana, com competência especial para actuar nas zonas rurais, onde a criminalidade atingia o seu auge. O caso da prostituição e meretrício foi presente à primeira reunião municipal com o Delegado de Saúde a informar entre outras coisas do péssimo estado em que se encontrava o dispensário onde se faziam as inspecções às mulheres. A presença de médicos entre a primeira edilidade muito terá contribuído para ir resolvendo o problema e se apostar mesmo na recuperação de muitas delas.


Os patrões deixaram de ser “donos” dos seus empregados. As Associações de Classe cimentaram posições, os sindicatos foram crescendo e o recurso à greve ganhou força legal. Em Évora a greve de 1912 foi paradigmática da ascendente importância dos trabalhadores rurais, que nesse ano criaram o seu sindicato com os corticeiros a seguiram-lhe as pisadas. Na cidade se realizaram igualmente os primeiros congressos nacionais de ambas as actividades, enchendo as suas ruas de gente laboriosa que noutros tempos não o fazia ou se a tanto lhes chegava a necessidade caminhavam humildes e cabisbaixos, vergados à sua condição de párias da sociedade.


Alterações importantes na vida das cidades ocorreram também no campo laboral, onde há muito se pugnava pela regulamentação de um horário para os trabalhadores do comércio e da indústria que consagrasse igualmente o direito ao descanso semanal obrigatório. Nas lojas e nas fábricas, em geral trabalhava-se todos os dias, do nascer ao pôr do sol. Em 8 de Março de 1911 o Governo Provisório, sob proposta  do Ministro do Interior, António José de Almeida, decretou o dia de domingo como de descanso obrigatório para todos os assalariados, ficando no entanto a regulamentação a cargo dos Câmaras Municipais, a qual deveria estar concretizada no prazo de um mês.


Em Évora a edilidade só veio a dar por concluída a adaptação do diploma à realidade concelhia em finais de Março. Em 2 de Abril, a vereação presidida por Agostinho Felício Pereira Caeiro e composta ainda por Manuel Gomes Fradinho, Francisco Maria Nunes, Manuel Raimundo Baleizão, João José d’Oliveira, António dos Santos Cartaxo e José Joaquim d’ Almeida, aprovou o regulamento que entrou de imediato em vigor. Assim se estabeleceu o direito ao descanso semanal de 24 horas seguidas, normalmente aos domingos, exceptuados alguns casos relevantes, nomeadamente para os empregados dos hospitais, em que seria cumprido por turnos. Nos estabelecimentos de barbearia e cabeleireiro, de fotografia e no caso dos ferradores, o dia de descanso era a segunda-feira. 

Mas aos menores de dezasseis anos, de ambos os sexos, em nenhuma circunstância e sob nenhum pretexto poderia deixar de ser concedido o descanso ao domingo. O artigo 5º. do regulamento esclarecia que eram considerados assalariados «todos os indivíduos que estivesse ao serviço de outrém, mediante retribuição por salário fixo ou variável, comissão, participação nos lucros ou qualquer forma convencionada e todos aqueles que prestem serviço sem remuneração, ainda que sejam filhos ou parentes dos proprietários dos estabelecimentos em que se empreguem».

Texto: José Frota 


Pormenor do Órgão da Sé de Évora

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Pela primeira vez na Arena D’Évora - Corrida de Gala à Antiga Portuguesa





O Grupo de Forcados Amadores de Évora, vem respeitosamente informar os Exmos. Srs. Aficionados, que no próximo dia 30 de Outubro de 2011 na "corrida dos Triunfadores", que terá lugar na arena de Évora, Bernardo Patinhas cessará as suas funções de cabo do grupo e será seu sucessor António Alfacinha, elemento deste grupo.

Évora Perdida no Tempo - Interior do Café Arcada


Autor David Freitas
Data Fotografia 1940 - 1949
Legenda Interior do Café Arcada
Cota DFT3021 - Propriedade Arquivo Fotográfico CME

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Exposição de Fotografia “Chartres en Lumières”


Foi inaugurada na semana passada uma exposição de fotografia intitulada “Chartres en Lumières”, no edifício dos Paços do Concelho, que faz parte do programa das Comemorações dos 25 Anos de Évora Património Mundial.
Esta mostra consiste precisamente num registo fotográfico do evento “Chartres en Lumières”, realizado na cidade francesa de Chartres, geminada com Évora, e que reúne todos os anos, desde 2003, quase um milhão de pessoas para assistir à iluminação cénica multicolor dos principais monumentos da cidade, durante mais de 100 noites. No dia da inauguração terá também lugar uma conferência sobre o Património em Chartres.
Tal como Évora, a cidade francesa de Chartres também está inscrita na lista das Cidades Património Mundial da UNESCO. Localizada a 88 quilómetros de Paris, Chartres tem cerca de 42 mil habitantes e reúne uma comunidade portuguesa com cerca de cinco mil pessoas. A cidade é famosa pelos vitrais das suas igrejas, medievais e contemporâneos, e possui um Centro Internacional do Vitral que contribuiu para preservar e desenvolver esta arte desde o início do século XII até à actualidade.
Esta exposição é uma organização conjunta das Câmaras de Évora e Chartres e vai estar patente ao público até ao dia 31 de Março de 2012, podendo ser visitada de segunda a sexta-feira, das 9:00 às 17:30.

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Pormenor da Sé de Évora

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Câmara Municipal distinguiu reformados do ensino


A Câmara Municipal de Évora organizou, no Museu de Évora, uma cerimónia que visou distinguir o pessoal docente e não docente que se reformou no ano lectivo de 2010 – 2011.

Como prova de respeito e admiração pelo trabalho realizado pelo pessoal docente e não docente nos estabelecimentos de ensino do concelho, a autarquia eborense dinamiza este evento desde há alguns anos, num convívio muito apreciado por todos.

Esta cerimónia contou também, além do pessoal reformado, com representantes das direcções dos Agrupamentos de Escolas e das escolas secundárias da cidade.

A actuação da Orquestra de Cordas da Associação Eborae Musica deu início ao evento, seguida de uma visita guiada dos participantes ao Museu de Évora feita pelo grupo de voluntários da referida instituição.

Após um novo momento musical, desta vez da competência do Ensemble de Trompetes da Eborae Musica na sala do Retábulo, foi tempo de dar as boas vindas, através de uma alocução proferida pelo Director do Museu, António Camões Gouveia, à qual se seguiu também uma intervenção por parte da Vereadora da Câmara de Évora, Cláudia Sousa Pereira.

De seguida, cada um dos reformados distinguidos foi convidado a assistir à apresentação de um depoimento em vídeo dos seus antigos colegas de trabalho sobre a sua pessoa, uma surpresa que muito os sensibilizou.

Um jantar acompanhado de uma actuação musical pelo Ensemble de Clarinetes da Eborae Musica marcou o resto do programa oferecido a estes profissionais que deram o seu melhor em prol da comunidade e das novas gerações de munícipes.

Uma cerimónia integrada na programação camarária de actividades que marcam o início do ano lectivo de 2011- 2012, que deixou satisfeitos todos os envolvidos e para o êxito da qual contribuiu significativamente a Eborae Musica com uma colaboração de grande qualidade.

Évora Perdida no Tempo - Largo da Porta de Moura


A construção do Palácio da Justiça (1963) obrigou à demolição do edifício existente no espaço correspondente ao actual tabuleiro no Largo da Porta de Moura.


Autor David Freitas
Data Fotografia 1963 ant. -
Legenda Largo da Porta de Moura
Cota DFT3179 - Propriedade Arquivo Fotográfico CME

sábado, 22 de outubro de 2011

DIRECTOR de OBRA - Engº Electrotécnico (ÉVORA)

FUNÇÃO: A função consiste em dirigir uma equipa que trabalha com electricidade de alto risco. Coordena a execução da obra nos aspectos técnicos, regulamentares, económico-financeiros, estécticos ,urbanísticos e ambientais, de conformidade com o projecto, licenças e demais autorizações e condições de contrato, com o objectivo de assegurar a sua adequação ao fim proposto.

LOCAL DE TRABALHO : ÉVORA

REQUISITOS:

- Bacharelato ou Licenciatura na área de Engenharia / Electrotécnica

- 2 anos de experiência na função.

-Capacidade de coordenação, liderança, planeamento, orientação para o cliente....

-Disponibilidade imediata para trabalhar em ÉVORA.



Todos os candidatos interessados deverão enviar C.V. com urgência para o email:


Grupo EGOR - Rua Joaquim António de Aguiar, nº 35, 1070-149 Lisboa

Telef: 21 154 77 77 / 82



sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Capela dos Ossos


A Capela dos Ossos é um dos mais conhecidos monumentos de Évora, em Portugal. Está situada na Igreja de São Francisco. Foi construída no século XVII por iniciativa de três monges que, dentro do espírito da altura (contra-reforma religiosa, de acordo com as normativas do Concílio de Trento), pretendeu transmitir a mensagem da transitoriedade da vida, tal como se depreende do célebre aviso à entrada: "Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos". A capela, construída no local do primitivo dormitório fradesco é formada por 3 naves de 18,70m de comprimento e 11m de largura, entrando a luz por três pequenas frestas do lado esquerdo.
As suas paredes e os oito pilares estão "decorados" com ossos e caveiras ligados por cimento pardo. As abóbadas são de tijolo rebocado a branco, pintadas com motivos alegóricos à morte. É um monumento de uma arquitectura penitencial de arcarias ornamentadas com filas de caveiras, cornijas e naves brancas. Foi calculado à volta de 5000, provenientes dos cemitérios, situados em igrejas e conventos da cidade. A capela era dedicada ao Senhor dos Passos, imagem conhecida na cidade como Senhor Jesus da Casa dos Ossos, que impressiona pela expressividade com que representa o sofrimento de Cristo, na sua caminhada com a cruz até ao calvário.




Poemas existentes dentro da capela

Poema sobre as caveiras
Coluna de caveiras
As caveiras descarnadas
São a minha companhia,
Trago-as de noite e de dia
Na memória retratadas
Muitas foram respeitadas
No mundo por seus talentos,
E outros vãos ornamentos,
Que serviram à vaidade,
E talvez...na eternidade
Sejam causa de seus tormentos.


Poema sobre a existência
A imagem macabra dos esqueletos pretende lembrar a transitoriedade da vida
Aonde vais, caminhante, acelerado?
Pára...não prossigas mais avante;
Negócio, não tens mais importante,
Do que este, à tua vista apresentado.
Recorda quantos desta vida tem passado,
Reflecte em que terás fim semelhante,
Que para meditar causa é bastante
Terem todos mais nisto parado.
Pondera, que influído d'essa sorte,
Entre negociações do mundo tantas,
Tão pouco consideras na morte;
Porém, se os olhos aqui levantas,
Pára...porque em negócio deste porte,
Quanto mais tu parares, mais adiantas.

Este soneto é atribuído ao Padre António da Ascensão Teles, 
pároco da freguesia de São Pedro (na igreja de São Francisco) entre 1845 e 1848.

Sé de Évora

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Circo Walter Dias em Évora de 21 a 23 de Outubro 2011




As Instituições Financeiras de Évora


Assim que entrou em funções o Governo Provisório da República assumiu como prioritária a tarefa de reformar o sistema monetário nacional, fazendo substituir o monárquico real (plural: reais ou réis) pelo escudo, de denominação mais adequada ao novo regime. A nova moeda entrou em vigor pela publicação de um decreto de 22 de Maio de 1911, e correspondia tanto em termos de valor como no de ouro fino à de 1.000 réis e apresentava-se em centavos, ou seja, dividida em cem partes iguais, colocando-se ao nível das dos outros países. Punha igualmente termo aos inconvenientes práticos da utilização do real, de valor muito pequeno e representado na escrita por um significativo número de algarismos.

Da emissão de notas e cunhagem de moedas se encarregou o Banco de Portugal, cujo 5º Governador foi Inocêncio Joaquim Camacho Rodrigues, natural de Moura e deputado eleito pelo círculo de Évora até 1915. Antes tinha sido nomeado Director Geral da Fazenda e Ministro das Finanças, sempre caucionado por José Relvas, que nutria por ele grande admiração intelectual. No cargo de Governador do Banco de Portugal se manteve até 1935, apesar da sua reputação e competência terem sofrido grande abalo quando foi ludibriado por Alves dos Reis, no célebre caso das notas falsas de 500$00.

Cabe aqui lembrar que o Banco de Portugal havia sido criado por decreto régio de 1846, com a dupla função de banco comercial e emissor, sendo resultado da fusão do Banco de Lisboa, fundado em 1821, com o objectivo de conceder créditos e aceitar depósitos, e da Companhia Confiança Nacional, lançada em 1844. Depois de vários contratos com o Governo, o Banco de Portugal tornou-se em 1887 a entidade bancária estatal, que passou a exercer em acumulação com a função de Caixa Geral do Tesouro e obrigando-se a criar agências em todas as capitais de distrito do Continente e Ilhas. Apesar de responsável pelo financiamento da dívida pública e de regulador do sistema financeiro do país, só em 1891 adregou a exclusividade na emissão da moeda.

Em Évora, o Banco de Portugal abriu a sua Agência no dia 24 de Setembro de 1892 no edifício da Praça de Giraldo em que ainda se mantém, e estava devoluto desde que a Câmara o deixara dez anos antes para se instalar na Praça de Sertório. O banco recuperou, com alguns cortes polémicos e sob uma traça afrancesada, os antigos Paços do Concelho de Évora, construídos no reinado de D. Afonso V e alvo de restaurações em 1481 e 1519 por ordem, respectivamente, de D. João II e D. Manuel I. Apesar de alguma controvérsia sobre a intervenção realizada, pode dizer-se ainda assim que o imóvel de algum valor patrimonial foi salvo da ruína que já o ameaçava.

Na cidade já existiam, no entanto, duas entidades bancárias: o Banco Eborense e o Banco do Alentejo, ambos fundados em 1875, ainda que o primeiro tenha funcionado no ano anterior com a designação de Caixa de Crédito Eborense. Segundo Helder Adegar da Fonseca, em “O Alentejo no século XIX – Economia e Atitudes Económicas” ,«em meados do século destacavam-se em Évora duas instituições como importantes fornecedoras de dinheiro a crédito: a velha Misericórdia local e a Casa Pia». A necessidade da criação de bancos era entendida, nomeadamente pelos grandes lavradores, como uma necessidade de extrema urgência visando o empréstimo de dinheiro a prazo.

É assim, grosso modo, que surge a citada Caixa de Crédito Eborense, com sede na Praça de Sertório, dotada do capital social de 33 contos de réis dividido em 660 acções (50 mil réis cada) e destinada a receber depósitos sem juro, à ordem, e com juro, a prazo fixo, fazer empréstimos a corporações do distrito e realizar descontos de letras. Os resultados obtidos levam os homens fortes da sociedade – o referido investigador identifica os quatro principais como sendo o visconde da Esperança, os lavradores José Maria Ramalho Perdigão e José Joaquim de Moura Amaral e o negociante Manuel Eduardo de Oliveira Soares – a proceder ao aumento de capital que se irá fixar nos 1000 contos.

Escassos dias antes, com sede em Évora na Praça de Giraldo e filial no Porto é anunciada a criação do Banco do Alentejo, iniciativa que envolveu por banda dos locais os negociantes João Lopes Marçal, Eduardo de Oliveira Soares, José António Soares Pinheiro, António Lopes Horta e António Simões Paquete; os proprietários e lavradores José Sebastião Torres Vaz Freire, José Carlos Gouveia, e Joaquim de Matos Peres; os médicos José Lopes Marçal e Joaquim Henriques da Fonseca e os professores liceais José da Fonseca e Costa e João Augusto Calça e Pina. Os nortenhos eram cinco com ligações ao Banco Comercial de Viana do Castelo.

O capital social inicial foi de 1.200 contos, divididos em 24.000 acções de 500 mil réis cada mas com possibilidade de alargamento aos 2.000. No âmbito da sua actividade tinha por objectivo «as operações de um banco de circulação, descontos e depósitos e todas as demais que forem próprias da sua natureza. Entre outras das mais destacadas teve a da emissão de notas. Foi um dos nove bancos nacionais que teve autorização para o fazer até à concessão da exclusividade ao Banco de Portugal.

Quando se implantou a República ambos gozavam de solidez e estabilidade. Helder Adegar da Fonseca, na obra já mencionada, considera que «a criação dos dois bancos teve importantes repercussões no mercado local de capitais. Por um lado, colocaram-se entre os principais fornecedores de crédito bancário na região, como o mostram o movimentos activos dos créditos hipotecários e em conta corrente realizado entre
1881 e 1910, sendo provável que o Banco Eborense tivesse uma posição muito forte no distrito de Évora. Em segundo lugar, com os depósitos a prazo, atraíram uma parte importante e crescente da poupança local».

Com alguma surpresa, o Banco Eborense entrou em fase de acelerado declínio, tendo encerrado em 1918. Não tinha conseguido suportar a garantia de segurança que o investimento em títulos governamentais viera trazer ao mercado de capitais. Em 1920 foi incorporado no Banco Nacional Ultramarino, entidade bancária criada em 16 de Maio de 1864 como entidade emissora de dinheiro para os territórios ultramarinos portugueses. Em contrapartida, em 1915 foi constituída na área dos seguros “A Pátria” – Companhia Alentejana de Seguros, velha aspiração dos lavradores que pretendiam proteger as suas searas sem que o crédito obtido deixasse de ser avalizado exclusivamente pelas suas terras.

Era deste modo que procediam as três principais seguradoras com agências locais, todas sediadas na Rua de Avis: “Portugal”, “Portuense”, “Portugal Previdente” e “La Union e Fénix Espanhola” A 24 de Agosto reúne pela primeira vez a comissão organizadora que coordenou os trabalhos de fundação e instalação da companhia. Fica definido que o capital social será de 500.000 escudos, divididos em 10.000 acções de 50 escudos, as quais ficam subscritas em três meses. 

Com 200 acções, o máximo permitido legalmente, ficaram Inácio Fernandes Ramalho de Barahona, João Lopes Aleixo, Joaquim Simões, José António Fernandes Potes, José Rebolado Formozinho, José Joaquim de Oliveira e Júlio Rodolfo Fernandes Potes. José Gomes Severino arrebata 150, Alfredo Augusto Cunhal Júnior 110 e Luís Sangremann Proença 105. É este grupo de homens, entre os quais se notam alguns republicanos, que constituirão o núcleo duro de um total de 837 accionistas.

Estabelecendo a sua sede nos nº.s 24 e 25 da Praça de Giraldo, é no seguro agrícola que a “ Pátria “ concentra as suas preocupações, deixando bem vincado que é filha de lavradores. O resto é uma história de sucesso que ultrapassa o horizonte temporal desta edição.

Texto: José Frota 

Évora Perdida no Tempo - Livraria Nazareth


Autor David Freitas
Data Fotografia 1966 -
Legenda Livraria Nazareth
Cota DFT3112 - Propriedade Arquivo Fotográfico CME