MOVIMENTO ARRISCADO
Cur. Daniel Moutinho (PT) e Eleonora Marzani (IT)
MÚSICA/PERFORMANCE/INSTALAÇÃO/DANÇA/CONVERSAS/FESTA
Convento dos Remédios e Espaço Celeiros
Évora 7, 8, 9, 10 e 14, 15, 16 e 17 de Julho, a partir das 23h
Entrada Livre
Movimento Arriscado é uma plataforma promovida pela primeira vez no âmbito do Festival Escrita na Paisagem, cujo tema deste ano é o re:play. Através desta plataforma, o festival perpetua o seu compromisso, a sua aposta nos novos criadores. É uma plataforma de emergência. Em primeiro lugar, porque faz emergir na sua programação um espaço que se preocupa verdadeiramente com as interrogações artísticas dos jovens criadores, em dar-lhes visibilidade, em assisti-los no caminho que eles procuram traçar. Em segundo lugar, porque urge a problemática actual de uma política cultural estruturada, que dê lugar e apoio aos novos criadores que após terminarem a sua formação académica, batalham por este mesmo espaço de visibilidade que o festival oferece. Chama à atenção de uma questão que devia ser de ontem. O que fazer com os novos criadores? Que política cultural tem o país, ou mais localmente, a cidade, que permita a estes novos criadores fazer o seu trabalho e dessa forma contribuir para a cultura local e nacional?
Lançámos o desafio a inúmeros jovens criadores, muitos dos quais estudam em Évora, para que acordassem a cidade com a sua voz, com a sua procura. Que fizessem parte da dinamização da cidade, aproveitando esta plataforma como processo de aprendizagem, como oportunidade de correr um risco, ou de o traçar.
O Festival Escrita na Paisagem é, desde o seu começo, uma casa que alberga os novos criadores e que se orgulha disso. Serviu de casa para mim, quando há três anos me abriu a porta e me deu um lugar para eu crescer e aprender. Foi a minha Universidade de Verão, mas mais que isso, foi um despertador e ainda continua a sê-lo. Acorda a cidade para mostrar o que ela, por norma, se esquece de ver. Os jovens e a sua importância no crescimento cultural, o caminho que eles percorrem, o risco com que eles marcam o seu trabalho artístico. São caminhos que se traçam, O Festival escolheu este entre os muitos que vai percorrendo. E como jovem só posso dizer, ainda bem que apareceu no nosso caminho.
Daniel Moutinho
Já tudo foi dito, já tudo foi feito | nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
Podemos fazer alguma coisa nova hoje? Estamos condenados a re:petir-nos nas nossas criações, dispondo camadas sobre camadas, para re:cuperar esse húmus ilimitado, que nos precede e nos sustém, mesmo que não tenhamos consciência da sua existência. A criação artística contemporânea mostra-nos que o que nos rodeia, nos domínios do espaço e do tempo, não é uma matéria negra que nos assoberba, reprime ou sufoca, mas antes um horizonte aberto que se desdobra num vasto conjunto de possibilidades, abertamente ao nosso alcance.
Quais são as preocupações dos criadores de hoje perante esta paisagem?
A procura de um confronto com o passado abrangente é um dos estímulos partilhado pelos artistas participantes neste Movimento Arriscado. A busca de uma relação re:novada entre o corpo humano e a arquitectura de Évora é a proposta da Oficina Movimento, um laboratório de introdução à dança contemporânea: explorar novas possibilidades de nos re:posicionarmos na cidade, dentro das suas paredes seculares, em particular as do edifício do Convento dos Remédios. A história da arte, em particular a história da performance e os seus idolatrados ícones – como Yves Klein, Marina Abramovic e Franko B –, inspiram re:criações, transformadas em ecos por novas vozes, como são os projectos-experiência incluídos em Kinda Li’l MoMa e os trabalhos de Catarina Lopes e André Salvador.
A análise da história pessoal é o ponto de partida para a pesquisa sobre a identidade, um assunto amplamente explorado pela criação artística das últimas décadas, e que é igualmente explorada em Movimento Arriscado. Uma tentativa de re:construir a memória pessoal e a interacção entre passado e presente, com base no arquivo familiar, é o que alimenta a performance de Márcio Pereira.
Por outro lado, a memória de toda uma geração pode ser recuperada através de uma arqueologia dos “média”, como acontece no projecto de Carlos Rodrigues ao transpor imagens de VHS para formatos mais actuais, ou na sessão de Dj-Vj dos Jijeis Altemente + Blue Moustache, inspirada nos míticos videojogos dos anos 80 e 90. De memórias (mesmo recentes) se alimentam ainda projectos como os dos alunos de electroacústica (alunos e professor da Universidade de Évora), a abordagem noise dos Psychotic Kindergarten, ou os processos utilizados em Symbol Transfer, a circular entre fotografia, infografia e som.
Há projectos de percepção e fruição imediata, com os quais todos se podem identificar, e também projectos que nos pedem abandono – como as atmosferas musicais de Di-Ga-Ba. Por outro lado, também há trabalhos que re:querem a concentração do público, uma observação e audição participativas e atentas, como é o caso dos vídeos de André Uerba, e a performance de Bárbara Fonseca e Telma Santos.
Se há materiais, objectos, sons e corpos que procuram o confronto-choque, há também um grupo de artistas que aposta em jogos de ambiguidades e justaposições de diversas realidades. Assim, assistimos à construção de ficções, mundos e personagens, como na performance Segura-te ao meu sofá e À prova de fogo e de bala (Ai! A Super-Artista incógnita). Brincar com o efémero é a premissa de base da escultura-instalação de Maria José Correia. Um trabalho feito em pão, que perturba assim o conceito de escultura como arte produtora de objectos eternos.
Assim, o programa de Movimento Arriscado desdobra-se em projectos cujas premissas são criar algo de novo, partindo de regras pré-estabelecidas, libertas do passado e de pré-determinações, sem caminhos já percorridos, procurando novas formas de espontaneidade.
Dois são os palcos onde o Movimento Arriscado tem lugar: o Convento dos Remédios e os Antigos Celeiros da EPAC. O primeiro, votado à arqueologia, é um espaço ainda por explorar pela arte contemporânea e cheio de possibilidades para a criação artística. O segundo, já conhecido pelas gerações mais jovens, é apresentado com uma imagem re:novada. Graças à colaboração entre os agentes artísticos com base no Espaço Celeiros – PédeXumbo, A Bruxa Teatro, Festival Escrita na Paisagem e Pachamama – todo o bloco, os edifícios, e a área circundante acolheram projectos de performance, música, vídeo, instalação, e CE-LE-BRA-ÇÃO! Movimento Arriscado é tudo isto e muito mais: um movimento fluido, irrequieto, irreprimível, imparável e sempre no fio na navalha.
Vivemos num caldeirão de referências. E nem por isso precisamos de sucumbir, pois há sempre uma maneira de seguir em frente. Cada um destes projectos procura o seu caminho, e é isso que aqui nos mostram.
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