O “Prémio Mercúrio – o melhor do comércio” foi
criado em 2007 pela Escola do Comércio de Lisboa com
o propósito de reconhecer e galardoar as entidades e
personalidades que, em cada ano, mais se tenham distinguido
pela contribuição e valorização do sector do
comércio e serviços e outras profissões a ele ligadas. A
Confederação do Comércio e Serviços de Portugal veio
a associar-se ao projecto como sua promotora. No ano
passado foram atribuídos os primeiros troféus em várias
categorias e diferentes ramos de actividade, mas nenhuma
das empresas eborenses que se candidatou logrou a
obtenção de qualquer distinção. No entanto, a Óptica
Havaneza esteve entre as cinco nomeadas para a categoria
de “Lojas com História”, tendo o triunfo sido arrebatado
pela Livraria Lello do Porto.
A selecção para o pequeno núcleo de empresas que
chegou ao escrutínio derradeiro foi prestigiante para a
firma, criada em 7 de Outubro de 1944 com um ob
objectivo
bem diferente do actual. Foram
seus fundadores Sebastião Mendes Bolas,
à data funcionário dos Correios, e sua
mulher, Maria das Neves, que se estabeleceram
na Rua Miguel Bombarda, nº 23,
com um pequeno estabelecimento a que
deram o nome de Havanesa (nessa altura
a palavra foi assim grafada) Eborense.
Destinava-se então à venda de tabacos
nacionais e estrangeiros, lotaria, papelaria
e artigos escolares. No anúncio publicado
no “Notícias d’ Évora” se esclarecia
que «as instalações da nova casa, não
são muito espaçosas mas são largamente
compensadas pelo variadíssimo sortido
de artigos que apresenta».
E porquê o nome estranho de Havaneza?
Provavelmente porque este era o
termo pelo qual se passaram a designar, desde a primeira casa em Portugal
com esse nome – fundada em pleno Chiado lisboeta no ano de
1864 pelo Conde de Burnay – todas as lojas cujo objectivo principal
era a venda de charutos e tabacos importados de Havana, sinónimo de
grande qualidade e sujeição a um serviço cuidado e profissional no seu
acondicionamento local. A primitiva Casa Havaneza, cuja existência
ainda perdura, foi imortalizada na literatura portuguesa ao longo dos
tempos, em obras de Eça de Queiroz (“Os Maias”), Guerra Junqueiro
(“No Chiado”) e, mais recentemente, de José Cardoso Pires (em “Lisboa
– Livro de Bordo”).
Com o passar do tempo, as havanezas foram-se, pois, estendendo um
pouco por todo o país como indicativo de estabelecimento de comercialização
de tabaco estrangeiro e de qualidade. Não foi assim motivo para
admiração que também o casal tivesse conferido esta designação à sua
loja, acrescendo-lhe apenas o qualificativo de eborense. Sete anos mais
tarde, em 1951, a firma cria uma filial na Praça do Giraldo com o intuito
de se dedicar ao ramo da fotografia.
Em 1960 Sebastião Mendes Bolas
encerra o primitivo estabelecimento na Miguel Bombarda (hoje faz
parte da Xavier Modas – Confecções Femininas) e aproxima-se da filial
para aí fundar a Tabacaria Paris. Maria das Neves mantém-se no comando
da loja até à sua reforma, após o que a mesma será trespassada.
É neste contexto que em 1968 Sebastião Bolas renuncia ao comércio
dos tabacos, lotarias e papelaria para passar a dedicar-se à actividade
óptica, sendo que o estabelecimento da Praça do Giraldo muda para
o contraditório e já obsoleto nome de
Óptica Havaneza (agora já com a ortografia
corrigida) Eborense. Entretanto, já
se envolvera no comércio e importação
de máquinas e ferramentas, criando em
1965 a Sebastião Mendes Bolas & Filhos,
Lda. (hoje Bolas – Máquinas e Ferramentas
de Qualidade, SA) e depois a Mafeuropa-
Máquinas e Ferramentas de Qualidade,
já extinta. Politicamente era um
homem de oposição ao regime salazarista,
tendo sido um dos 36 eborenses que
participaram no 3º. Congresso Nacional
da Oposição Democrática, realizado em
1973 na cidade de Aveiro.
Em 1987 a agora Óptica Havaneza Eborense
volta a mudar de poiso, recuando
um pouco nas arcadas. A empresa transfere-
se para a Rua da República nº 27,
em prédio próprio, o qual será objecto de
grandes obras de ampliação e modernização.
Reabre dividido por cinco secções:
recepção, óculos de sol, óculos de receituário,
contactologia, optometria e oficina,
das quais nalguns casos foi pioneira. Numa visão de futuro toma definitivamente
a dianteira no comércio óptico local, que entretanto floresce
porque os óculos deixaram de ser as cangalhas que eram usadas por necessidade,
a contragosto e muitas vezes às escondidas, para se tornarem
em objectos de moda, em adereços e adornos desejados, com atraentes
desenhos que valorizam o visual de mulheres e homens. As lentes de
contacto foram-se impondo e com elas foi possível até mudar a cor dos
olhos à vontade do freguês, como outrora se diria. O antigo anátema do
ou da “caixa de óculos” perdeu-se por deixar de ter sentido.
Foi tendo em conta esta evolução da empresa que a Associação Comercial
de Évora decidiu propor a sua candidatura ao Prémio Mercúrio,
na categoria de Lojas com História, a qual visa distinguir «lojas
que, com mais de 50 anos, conseguiram ir adequando o seu conceito e
adaptando a sua estratégia, de forma a continuarem a ser, ainda hoje,
negócios de sucesso e factores de diferenciação do comércio de rua e,
assim, pólos de dinamização das cidades bem como motivos de interesse
cultural e turístico».
O casal Mendes Bolas já há muito deixou o mundo dos vivos. O grande
crescimento da firma enquanto óptica deve-se contudo a seu filho
Francisco Mendes Bolas, o especialista na matéria e principal accionista
da empresa, que continua a manter uma designação desfasada no tempo.
De resto a Óptica Havaneza é hoje um êxito comercial, possuindo
mais uma loja em Évora e filiais em Montemor-o-Novo e Reguengos
de Monsaraz.
Texto: José Frota
Fotografias: Carlos Neves
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